São Paulo, domingo, 13 de março de 1994
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Jovem da noite cria ritual 'destroyer'

LUIZ CARLOS DUARTE
DA REPORTAGEM LOCAL

São 3h da madrugada de sábado para domingo, 6 de março, no encontro das ruas Mourato Coelho e Wisard (Vila Madalena), a esquina "destroyer" de São Paulo. Cerca de 40 jovens, todos homens, embalados por cerveja, conhaque e batidas de pinga, conseguem, enfim, acertar um "alvo".
O grupo cerca o Fiat Uno Mille preto dirigido pela universitária Isabel Dias, 18. Os jovens agarram as laterais do carro e balançam violentamente, ato conhecido como "destroyer". Apavorada, Isabel pisa no acelerador, escapa mas bate em outro Uno (vermelho), pilotado pela psicóloga Silvana Gramignole, 26, que passava pela rua Mourato Coelho.
A batida é comemorada como se fosse um gol. Todos gritam, correm e cercam os carros. O prejuízo é saudado em coro: "Preju, preju". Um pega o pára-choque do chão, ergue com os dois braços, como se fosse troféu, e desfila pela rua. No meio da confusão, alguns roubam o farol dianteiro e o limpador de pára-brisa traseiro do carro.
As meninas ainda ouvem gracejos. "Passaram a mão em mim", conta Silvana. Isabel, que cursa o segundo ano de administração na USP, apela para o rap de Gabriel, O Pensador, para definir a situação: "Esse é o retrato da nossa juventude, seja o playboy da maconha ou playboy da saúde."
Os vândalos de carros são apenas um dos grupos da esquina "destroyer", ajuntamento confuso de neohippies, boêmios, surfistas e amantes do reggae. "Esse pessoal é errado. Vem para cá porque virou moda e acabam com o local", diz Adilson Cerqueira, 23, cover de Vernon Reid, guitarrista do Living Colour, e frequentador do lugar há três anos.
À meia-noite de um sábado, concentram-se ali pelo menos 3.000 pessoas. Para atender a clientela, que não cabe mais nos cinco bares, surgiram barracas improvisadas que vendem batidas de pinga, cachaça pura, uísque e a bebida preferida, "chiclete com banana" (pinga com groselha).
A esquina é hoje ponto final de caravanas e carros lotados que chegam de Santana (zona norte), Rio Pequeno (zona sul), Jaguaré (zona oeste) ou Mooca (zona leste).
Dia 5, a "galera" de Rio Pequeno –12 jovens– saudou a chegada na esquina, com o estouro de um champanhe "Espuma de Prata" de 2,5 litros.
Sem dinheiro para táxi, vieram de ônibus. Batidas, pinga e "maria mole" (mistura de conhaque com martini) animaram o grupo até 6h da manhã, hora de voltar para a casa, quando os ônibus já circulam. "Somos da paz, mas se tiver que rolar alguma coisa, a gente rala", diz o contato publicitário Xavier Batista Torrentes, 16.
Para Reinaldo Lopes Igor, 21, do grupo "destroyer", "a esquina é uma reunião particular". "A gente chama as gatas e rola todas. O beijo e o carro são o limite."

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Sobre a Vila Madalena na pág. 4-3

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