São Paulo, sábado, 19 de março de 1994
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O aliado natural

LEÔNCIO MARTINS RODRIGUES

"O primeiro e mais importante objetivo de todos os partidos políticos é derrotar os demais e assumir ou conservar o poder... O partido não é um grupo de homens que tenciona promover o bem-estar público baseado em algum princípio comum" (Joseph Schumpeter, "Capitalismo, Socialismo e Democracia").
Avaliando deste ângulo, as alternativas colocadas concretamente para o PSDB, os benefícios de uma aliança com o PFL me parecem bem maiores do que as desvantagens. Aumentam tanto as probabilidades de êxito nas urnas quanto as bases parlamentares e políticas de apoio (na hipótese de que Fernando Henrique chegue à Presidência).
Ocorre que, para o PSDB, as chances de encontrar aliados fortes "à esquerda" simplesmente não existem. O PT e o PDT já têm seus candidatos nada dispostos a abandonar a raia. O PCdoB e o PSB, além de muitos distanciados ideologicamente do PSDB, são muito fracos, sendo impensável, por exemplo, uma aliança entre FHC e João Amazonas, mesmo que este último aceitasse humildemente ser candidato a vice.
Dos partidos importantes de "centro" ou "direita", sobrariam o PMDB e o PPR. Alguém acredita que Quércia ou Maluf, pelo menos até o primeiro turno, poderiam compor com Fernando Henrique?
Desse modo, para o PSDB, o PFL é hoje o aliado natural. É o segundo partido brasileiro em termos de congressistas e governadores, fato nada desprezível em termos dos preciosos minutos no horário gratuito. É forte no Nordeste, onde o PSDB é fraco. Tem hoje muitas afinidades ideológicas e programáticas com o PSDB, ou com a ala FHC-Serra que dão o tom. E, "last but not least", não dispõe, apesar de sua importância, de um nome para entrar para valer na corrida presidencial.
Esse último aspecto é, talvez, o mais relevante. Se o PFL tivesse um candidato com chances, certamente exigiria que qualquer acordo fosse fechado tendo-o como titular. Como não tem, precisa conformar-se com a Vice-Presidência... o que, no Brasil, sempre dá alguma esperança.
Contudo, é preciso reconhecer que a aliança com o PFL de Marcos Maciel e ACM deve produzir algumas manchas na imagem de FHC, em particular junto à intelectualidade socialista. Eleitoralmente o prejuízo não deverá ser muito forte. É possível igualmente que algumas defecções possam ocorrer dentro do próprio PSDB. O "oportunismo eleitoral" de FHC será seguramente explorado pelos demais candidatos, especialmente por Lula. Mas já há certo tempo que segmentos do PSDB e do PFL estavam em rota de aproximação.
Na verdade, separa-os mais o passado distante do que o presente. O fim do socialismo, o declínio do nacional populismo, o retorno do país à democracia, a crise do estatismo, entre outros acontecimentos deste surpreendente final de século, diminuíram o leque ideológico que se estruturava, fundamentalmente, em torno do eixo intervencionismo versus livre iniciativa. É assim que muita gente deve dizer também: esqueçam tudo o que eu escrevi ou disse.

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