São Paulo, terça-feira, 22 de março de 1994
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Contra a proibição de indexação na nova moeda

RUBENS PENHA CYSNE; AUGUSTO JEFFERSON DE OLIVEIRA LEMOS

RUBENS PENHA CYSNE
AUGUSTO JEFFERS0N DE OLIVEIRA LEMOS
O artigo 11 da MP nº 434, de 27/02/94, proibe cláusula de reajuste de valores com periodicidade inferior a um ano, nos contratos em URV, a partir de 1º de março.
Tal proibição deve ser eliminada do texto da MP 434, tendo em vista o seu efeito nocivo sobre vários mercados. O mais afetado no momento talvez seja, dentre outros, o mercado de imóveis para aluguel. Como se pode exigir que os proprietários passem 12 meses sem qualquer tipo de proteção contra perda de valor da moeda, se eles nem ao menos sabem como será feito o controle de tal moeda por parte do Banco Central? O que lhes garante que a inflação com o real será zero ou próxima de zero após a sua implantação, conforme prometido? Afinal, estabilidade de preços não é exatamente a tradição brasileira.
Tais mercados só não estão totalmente paralisados devido a sua eficácia em contornar legislações mal feitas. Concentramo-nos aqui no mercado de aluguéis, mas o raciocínio pode ser perfeitamente estendido a outros mercados operando com contratos de longo prazo. O que tem sido feito?
A primeira possibilidade tem sido aumentar substancialmente o preço total do aluguel em URV, para proteção contra uma possível inflação nesta moeda e no real.
Um segundo expediente tem sido a passagem à informalidade, com locações por temporada pagas à vista ou com contratos informalmente denominados em dólar.
Uma terceira possibilidade de viabilizar estes mercados de longo prazo tem se dado através da utilização de contratos com cláusulas de repactuação automática a cada dois meses ou três meses, como substituto da indexação explícita. Neste caso, as mensalidades passam a embutir a expectativa de inflação para o período a que se aplicam, exatamente como nos contratos pré-fixados. Este tipo de mecanismo é utilizado como substituto da indexação explícita em economias com taxas de inflação moderadas, mas não desprezíveis.
Tal expediente não deverá ser proibido pelo governo por dois motivos. Primeiro, porque a livre negociação associada à repactuação baseia-se não apenas na inflação passada, mas também na inflação futura, como quer o governo. Segundo, porque trata-se este de expediente semelhante ao dos salários, que podem ser repactuados nas datas de dissídios. Porque poderia haver dissídios para os salários e não para os aluguéis?
Evidentemente, tratam-se estes três expedientes de subterfúgios criados pelo mercado de móveis, dentre outros, para driblar a proibição de indexação na nova moeda. O mais correto, evidentemente, seria eliminar a proibição de indexação com prazo inferior a um ano, deixando às partes envolvidas a decisão sobre as cláusulas de negociação sobre seus acordos.

RUBENS PENHA CYSNE, 36, é professor e diretor de pesquisa da Escola de pós-graduação em Economia da Fundação Getúlio Vargas (RJ).

AUGUSTO JEFFERSON DE OLIVEIRA LEMOS, 48, é consultor da GW Consultoria. Foi membro da Comissão Executiva de Reforma Fiscal do Ministério da Fazenda (governo Collor).

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