São Paulo, quinta-feira, 24 de março de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O ridículo da crise

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Há um toque de ridículo em toda essa momumental crise entre os Poderes, aquecida por receios de intervenção militar. Há um simples fato desconhecido da esmagadora maioria dos brasileiros: qual os salários do funcionários públicos federais? Depois de você ler uns poucos números, logo vai concluir que a elite dos assalariados do Brasil, protegida por poderosos lobbies em Brasília, está no centro da crise. É, portanto, um briga dos privilegiados.
Vamos aos números oficiais, levantados pelo ministérios da Previdência Social e do Planejamento. O salário médio de um funcionário do Legislativo é de US$ 2.127 –pouquíssimos brasileiros têm tanto dinheiro no bolso no final do mês. Lembre-se mais: eles são estáveis, não são demitidos. Quando se aposentam, embolsam em média por mês US$ 2.600.
Os servidores do Judiciário recebem em média US$ 1.342 mensais –menos que o Legislativo, mas um salário nada desprezível. Hoje, a média das aposentadorias é de US$ 3.000, um número que não passaria na cabeça da imensa maiores dos cidadãos comuns, obrigados a uma aposentadoria vexatória.
No Executivo é menor, mas razoável para os padrões nacionais, onde quase dois terços da população vive com menos de dois salários mínimos. Seus funcionários ganham por mês US$ 761. A média dos militares cai: US$ 481. Entende-se, assim, o clima dos quartéis.
Daí se vê o lado ridículo desta crise. Por causa de uma briga em torno do aumento de 10% de assalariados já privilegiados, monta-se um monumental conflito. E, para completar o toque de comédia, dá-se um ar de revolta militar, num ensaio de ópera-bufa do movimento que, agora, completa 30 anos.
PS – O que irrita em toda essa discussão é que a categoria que melhor deveria ganhar, pela sua importância à cidadania, vive na miséria. É o professor de ensino básico. O Brasil só vai progredir, de fato, quando o professor for motivo de reverência diária –a começar pelos salários.

Texto Anterior: Linchamento
Próximo Texto: A democracia é a única saída
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.