São Paulo, sexta-feira, 1 de abril de 1994
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Gordos só são gostosos na Nova Guiné

BARBARA GANCIA
COLUNISTA DA FOLHA

Vale tudo: hipnose, macumba, simpatia e até tapa na cara. Já recorri a todos os métodos imagináveis para perder peso. Só no Spa Sete Voltas, de Itatiba, deixei umas 12 toneladas de lardo. Sem contar as humilhantes sessões de "mea culpa" nos Vigilantes do Peso, as injeções de enzimas na barriga e a ingestão de hediondos chás diuréticos.
Para diminuir as dimensões de minha pança sharpei –o cão chinês de pele pelancuda– já martirizei minha hipófise de tudo que é jeito. Nem mesmo a glândula pituitária da Amália Lucy sofreu tanto quanto a minha. Lembra da Amália Lucy, a filha do Geisel que era chamada de "Hino da Bandeira" –todo mundo conhece, mas ninguém canta? Nos anos 70, o país inteiro acompanhou a novela de seu problema na hipófise.
Pois bem. Poucas pessoas são mais abalizadas do que eu para falar sobre os deméritos da gordura. E, do alto da minha experiência de ex-hiperbólica e atual rechonchuda, eu digo: gordo é sem-vergonha. Isso mesmo, sem-vergonha. E não me venha o Roberto Carlos dizer, na música "Coisa Gostosa", que gordo é atraente. Atraente? Gordo só é gostoso na ótica dos canibais da Nova Guiné.
Para se refrescar no verão, o gordo é incapaz de pedir picolé de limão. Opta sempre por picolé de brigadeiro. Gordo come até coxinha com osso do dia anterior sem enrubescer.
E dá-lhe Hipoglos! Gordo não pode caminhar na praia que logo fica com a virilha assada. Gordo não pode andar de avião sem prejudicar o vizinho e não pode ser operado sem causar dor de cabeça no anestesista.
Gordo está sempre em pé de guerra com as vestes e ofega mais do que Michael Douglas em cena de sexo explícito com a Sharon Stone. Gordo é "incumprimentável" pois sua feito chafariz. A não ser que atenda pelo nome de Jô Soares, Fausto Silva ou Silvia Poppovic ninguém se apressa em apresentá-lo aos outros.
Só um país de mentalidade deturpada como o nosso pode glamurizar uma condição que é prejudicial à saúde. Mas esse modismo não é invenção exclusiva do Roberto Carlos, não. O presidente Itamar também tem seu naco de culpa. Se ele não tivesse se engraçado para cima daquela gorda sem calcinha, o país não estaria agora sofrendo de síndrome de Stendhal "à l'envers".

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