São Paulo, domingo, 3 de abril de 1994
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De patamar em patamar

DE PATAMAR EM PATAMAR

No final de fevereiro, quando a maioria dos índices de inflação já dava como favas contadas uma variação mensal acima dos 40%, o índice da Fipe, que mede a inflação no município de São Paulo, fechava o mês com então modestos 38,19%. Agora, quando o IGP-M já sinaliza 45,7%, a Fipe continua como a lanterninha dos índices, exibindo contudo uma aceleração tão assustadora quanto a dos outros. Os 41,31% da terceira quadrissemana de março situam-se de fato mais de três pontos percentuais acima da inflação registrada no mês anterior.
O índice traz para muitos o consolo de compensar o "patamar" de 45% que já transparece nos dados do IBGE e da FGV-RJ. Entretanto, mais que essa compensação, o incômodo surge do fato de haver tamanha dispersão entre os índices. É um sintoma de que o sistema de preços, com a URV, ainda não encontrou seu eixo de gravidade, ou seja, um autêntico patamar sobre o qual repousem as expectativas.
Particularmente preocupantes são o ritmo e a intensidade dos reajustes de preços de alimentos. A inflação da alimentação era de cerca de 36% ao mês no fim de fevereiro, mas agora é de mais de 48%, só dois pontos abaixo do mítico limiar a partir do qual se considerava, antigamente, estar em curso uma hiperinflação. Produtos "in natura", porém, chegaram a ser reajustados na base de quase 59% ao mês.
Parte dessa alta tem sido explicada pelas incertezas que cercaram a introdução da URV. De fato, os preços dos produtos agrícolas no atacado têm dado sinais de desaceleração nos últimos dias. Entretanto, não é difícil imaginar as dificuldades do assalariado que receberá um reajuste de cerca de 43%, correspondente à URV, e que gasta boa parte do salário com alimentação.
Já se sabe que a inflação brasileira não é do tipo explosiva. É também inegável que o reajuste salarial pela URV será melhor proteção para o trabalhador do que o anterior. Convém entretanto não subestimar os números em nome da crença na existência de algum "patamar" mágico. De patamar em patamar chega-se também ao cadafalso.

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