São Paulo, sexta-feira, 8 de abril de 1994 |
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Mostra faz painel do cinema independente
BERNARDO CARVALHO
Sinopse: Curtas e vídeos britânicos Quando: Até domingo Onde: MIS (av. Europa, 158, Jardins, zona sul, tel. 280-0896) A mostra de 30 vídeos e filmes britânicos de curta-metragem que o Museu da Imagem e do Som apresenta a partir de hoje até domingo é representativa, em sua diversidade, das principais tendências estéticas da atual produção do cinema independente no mundo. Com curadoria do crítico inglês Peter Wollen, a mostra "Arrows of Desire" (flechas do desejo) foi organizada como 2ª Bienal de Cinema e Vídeo do ICA (Instituto de Arte Contemporânea de Londres). A 1ª Bienal do ICA teve curadoria de Tilda Swinton, atriz e musa de Derek Jarman. Wollen optou por um panorama que parece fazer eco a obsessões detectadas do outro lado do Atlântico. Há de tudo um pouco. Da militância das minorias ao multiculturalismo. Em ambos os casos, há uma ênfase autobiográfica. Por exemplo: um vídeo como "Robert Marshall", de Stuart Marshall, um dos pioneiros da vídeo-arte na Inglaterra nos anos 70, narra a experiência do próprio realizador, soropositivo, relacionando a perspectiva de sua morte com a imagem do pai –já morto– em antigos filmes domésticos. O tema da doença aparece explicitamente em um outro filme ("Relax", de Chris Newby, que narra o inferno da espera pelo resultado de um teste de Aids) e implicitamente em boa parte do resto dessa produção (como no vídeo "You Do Something to Me", de John Maybury). Na questão multiculturalista, predomina o documentário ("A Touch of the Tar Brush", de John Akomfrah, sobre a miscigenação entre negros e brancos numa comunidade de Liverpool) por vezes combinado ainda com o ponto de vista autobiográfico ("Inbetween", de Robert Crusz). Dentro dessa tendência, o mais original é, sem dúvida, "Justice Sucks", de Vonnie. O vídeo de 50 minutos faz parte dos "Teenage Diaries", uma série da BBC em que adolescentes são convidados a filmar suas próprias vidas com a maior liberdade possível. Vonnie foi molestada sexualmente pelo padrasto quando era pequena (outra obsessão temática hoje) e colocada sob a guarda do Estado aos 12 anos. Seu relato tem a autenticidade de um retrato do mundo real narrado de dentro. O mais surpreendente é a quantidade de filmes de animação, com destaque para "The Vacuum", de Tim Rolt, que inclui atores, e "Door", de David Anderson. Esses filmes e vídeos parecem ser resultado de um novo esteticismo onde a natureza e a realidade são radicalmente manipuladas. Essa visão estetizada e artificialista do mundo (de onde o real e a natureza foram banidos) parece consequência de uma sensibilidade formada por clipes e de uma contaminação entre a produção de vídeos e de filmes que o curador Wollen diz prezar especialmente. Peter Greenaway é o maior representante dessa estética em que a decoração tomou o lugar da paisagem, e a natureza é apresentada como uma produção da cultura. "M is for Man, Music, Mozart", realizado para a BBC por ocasião do bicentenário do compositor austríaco, trata a natureza dentro de uma perspectiva totalmente cultural. Aqui, o cineasta utiliza uma enumeração artificial e minuciosamente construída (como já havia feito em "Afogando em Números") para ordenar a natureza (os instintos, os corpos) dentro de uma alegoria coreografada em seus mínimos detalhes. Texto Anterior: Filmes inéditos da Alemanha reunificada tratam do racismo Próximo Texto: Abril Pro Rock começa hoje no Recife Índice |
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