São Paulo, quarta-feira, 13 de abril de 1994
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A proposta de Constituinte

LUÍS NASSIF

Em fins do ano passado imaginava-se que, com o fisiologismo político na defensiva –com o escândalo do Orçamento–, haveria chance de impor medidas modernizadoras na revisão constitucional. Tinha-se esperança de que o processo seria liderado pelo então ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso, na condição de primeiro ministro de fato.
Foi esta expectativa a responsável pela pouca repercussão de uma proposta do deputado Gonzaga Mota (PMDB-CE), em setembro do ano passado, de Constituinte exclusiva.
Com o fracasso da revisão –em grande parte devido à falta de coragem de FHC de assumir a liderança do processo– o tema volta à pauta do dia.
Pela proposta do deputado Gonzaga Mota, haveria a eleição de uma Constituinte exclusiva, composta por 300 membros eleitos nos Estados e no Distrito Federal, em número proporcional às respectivas populações, garantindo pelo menos um representante em cada unidade federativa.
O texto é rigoroso para preservar a Constituinte de políticos profissionais e de partidos políticos. Propõe que todo constituinte eleito perca automaticamente mandato público que eventualmente esteja exercendo e se torne inelegível para as próximas eleições.
Os trabalhos se encerrariam impreterivelmente em 15 de novembro de 1994, preparando o país para o próximo presidente.
O deputado informa que está buscando saídas jurídicas para alguns impasses legais, que permitam a reapresentação da proposta. Especialistas em direito constitucional, no entanto, julgam que estes impedimentos não existem. A última Constituição estipulou prazos de cinco anos para revisões constitucionais. Mas não há nenhuma cláusula pétrea que impeça uma revisão de fixar data e regras para uma nova Constituição.
Neutralidade eleitoral
A única explicação para o fato de o ex-ministro FHC jamais ter se preocupado em explicitar as relações de causa e efeito entre as reformas estruturais e o sucesso do seu plano econômico é de cunho eleitoral.
Se mencionasse claramente que, sem as reformas o plano tenderia a fracassar, ficaria mais fácil aos seus adversários levantarem argumentos consistentes contra o plano, bastando para tanto mostrar que as reformas não ocorreram.
Deus pagão
O exercício da virtude transformou Betinho em santo. O exercício do vício, converteu-o em deus pagão, levando-o a incorrer no pecado da auto-idolatria.
A fraqueza demonstrada no episódio do dinheiro dos bicheiros engrandeceu a figura do homem. Agora, na busca de um álibi para o escorregão, ao afirmar que seu único erro foi ter mantido a doação em segredo, Betinho mostra uma face perigosa para sua imagem. A soberba pode tornar empedernido o coração mais generoso.
Café sem conserto
Os cafeicultores brasileiros não se emendam. A manutenção das cotações do café em níveis artificialmente elevados permitiu que países sem nenhuma tradição no setor virassem concorrentes do Brasil. Seguiu-se uma enorme crise no setor, que provocou um ajuste traumático da produção, ameaçando tirar esses concorrentes do mercado. Os preços começaram a se recuperar.
Em vez de buscar a competitividade, reduzindo custos de produção, alijando concorrentes do mercado pelo exercício da competitividade, volta-se novamente a forçar a barra, preparando uma nova crise de superprodução.

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