São Paulo, quarta-feira, 13 de abril de 1994
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Grupo islâmico vem se apresentar em SP

ANA FRANCISCA PONZIO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Os Derviches Rodopiantes da Confraria Mevlevi procuram manter viva uma tradição islâmica iniciada há 700 anos pelo poeta sufista Mvelana Djélal-Eddin Rumi.
Em entrevista à Folha, por telefone, Ahmed Kudsi Erguner, atual diretor da Confraria Mevlevi, falou da dança cósmica desenvolvida pelos Derviches – que, no passado, chegavam a ficar dias seguidos rodopiando em torno de si mesmos.
Formada por homens comuns, de diferentes profissões e nacionalidades, a Confraria Mevlevi reúne 12 dançarinos e 13 músicos, que hoje possuem sedes em Paris e Istambul (Turquia).
"Não temos patrocinadores. Vivemos da paixão por nossa arte", diz Erguner, que também é arquiteto e músico. Atuando como mestre da cerimônia Derviche, ele toca flauta Ney (pronuncia-se "nai").
"Feita de madeira de plantas do pântano, a flauta Ney é o principal instrumento da cerimônia, por que mestre Rumi relacionava essa flauta ao estado de pureza do ser humano."
Folha - O que os Derviches apresentarão no Brasil?
Ahmed Kudsi Erguner - Nossa confraria, comparada a outras confrarias sufis, tem uma cerimônia muito particular que consiste no rodopio que cada pessoa faz em torno de si mesma. Por isso, na Europa, a confraria é chamada de Derviches Rodopiantes.
As pessoas em movimento giratório evocam o deus interior e, portanto, essa dança tem um significado religioso. Nós vamos realizar essa cerimônia, que também se baseia em uma música muito especial, no Brasil.
Folha - Como essa cerimônia se desenvolve?
Ergumner – O início da cerimônia é o que chamamos de "Sema", palavra que significa ouvir. Nessa parte há uma recitação do Corão e uma improvisação introduzida pelo som da flauta "Ney" e por uma canção inspirada nos poemas de Djélal-Eddim Rumi.
O "Sema" prepara todos os participantes para o estado de consciência de deus.
Folha - O que ocorre a partir dessa consciência?
Erguner - Começa o que chamamos Mukbala (pronuncia-se mucábala), que é a confrontação. Os dançarinos ficam face a face, olhando nos olhos do outro, reconhecendo o outro.
Depois dessa celebração é que começa a dança dos giros, em frente ao mestre da cerimônia.
Folha - Essas danças seguem alguma regra?
Erguner - Cada dançarino pára e recomeça a girar de acordo com os quatro poemas da evolução humana, de Rumi.
Antes de cada recomeço os dançarinos fazem saudações uns para os outros e para o mestre da cerimônia. No final, a cerimônia fica por conta somente dos músicos.
Folha - Qual o objetivo de cada performance?
Erguner - Não há objetivos. Cada cerimônia é uma expressão de sensibilidade.
Folha - Quanto tempo cada dançarino é capaz de girar em torno de si?
Erguner - No começo, na época de nosso mestre Rumi, os giros podiam durar horas e mesmo dias seguidos, sem parar. Hoje o tempo não é tão importante, mas sim a qualidade do tempo...
Folha - Que tipo de treinamento a Confraria desenvolve?
Erguner - Nosso treinamento consiste no contato com os ensinamentos de nosso mestre e, obviamente, com todo o contexto do Islã.
Folha - E a habilidade técnica? Como é mantida?
Erguner - Há aulas específicas para a dança rodopiante. Um movimento especial que tem de ser estudado é o giro feito em um ponto fixo, com a perna direita girando em torno da perna esquerda.
Folha - Há um caráter minimalista nas danças e músicas?
Erguner - Não sei o que é minimalismo.
Folha - Os Derviches têm uma vida especial?
Erguner - Sim. Nossa vida é especial porque cada membro da comunidade está preocupado em aplicar às suas vidas os principais elementos do sufismo islâmico, ensinado por Djélal-Eddin Rumi.
Folha - Quais os principais elementos do sufismo?
Erguner - Há muitos elementos principais. O mais fundamental é o que, no Oriente, nós chamamos de busca do Islã. Isso significa perceber a presença do divino em cada momento de nossas vidas.
Folha - Qual a sensação que o espetáculo dos Derviches desperta no público?
Erguner - A cerimônia é muito hipnotizante para o olhar. É como uma flor que se abre lentamente. O que fazemos provoca uma pluralidade de sensações.

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