São Paulo, sexta-feira, 15 de abril de 1994
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Cassações, afinal

Quase três meses depois de encerrada a CPI do Orçamento, a Câmara finalmente aprovou as duas primeiras cassações de deputados envolvidos num dos maiores escândalos da história política do país. Até agora, o único resultado concreto havia sido a renúncia de alguns parlamentares antes do julgamento, que assim escaparam à pena de inelegibilidade por três anos e deixaram a sensação de que, depois de um relatório final até surpreendente –que pedia a cassação de quase uma vintena de congressistas–, o episódio poderia ainda, na prática, acabar "em pizza".
É evidente que a cassação de dois deputados fica muito longe de satisfazer a demanda por depuração dos hábitos políticos do país. É claro que o ritmo com que esse processo vem-se arrastando fica aquém da agilidade (não confundir com açodamento) que se espera do combate aos vampiros do erário. Ainda assim, o fato representa um passo, tímido, na direção correta.
É de se destacar porém o fato de que, se o Legislativo –mesmo sob o manto injustificável do voto secreto– superou momentaneamente o corporativismo e aproximou-se timidamente dos seus representados, isso deveu-se em boa parte à indignação da opinião pública. Com efeito, se o caso não tivesse suscitado tamanha repercussão, talvez não tivesse rompido com a tradição nacional de impunidade.
Assim, é fundamental o acompanhamento atento, pela opinião pública, das próximas ações do Legislativo no que tange ao escândalo. Há muitos outros suspeitos de atentados violentos contra o bolso do contribuinte circulando livremente pelos subterrâneos do Congresso.
Isso porém não basta. Se se pretende mesmo uma moralização da vida pública no país, o fim da impunidade política precisa ser seguido do fim da impunidade criminal. Se há parlamentares que cometeram delitos, que desviaram recursos públicos para seus próprios bolsos, é imperativo que sejam não apenas cassados como também punidos no âmbito da Justiça comum. Permitir que continuem a usufruir de dinheiro desviado é um insulto aos cidadãos que recolhem impostos.
Por mais que reconheça o avanço representado pelas cassações desta semana, enquanto esses parasitas da cidadania não forem adequadamente punidos a população tem o direito de ser cética em relação ao futuro da prática política do país.

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