São Paulo, sábado, 16 de abril de 1994
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Marc Jacobs volta como guru da moda jovem

DA REPORTAGEM LOCAL

Com um desfile somente para 60 convidados, entre descolados e compradores das principais lojas de departamento, o estilista Marc Jacobs provou ser o atual darling da moda americana. O desfile aconteceu em seu ateliê no SoHo no último sábado, dia seu aniversário de 31 anos. Foi um dos maiores sucessos da temporada outono-inverno.
Esta é a primeira coleção que leva seu nome, desde que Jacobs foi demitido da marca Perry Ellis, há dois anos. O motivo da demissão foi sua versão para o grunge, o estilo desleixado celebrizado pelos jovens de Seattle, que desagradou os conservadores clientes da marca Perry Ellis (leia nesta página). Agora, Jacobs não fez por menos e foi o único estilista a consegur reunir todas as tops. Após o desfile, o estilista –com os longos cabelos presos num rabo-de-cavalo– recebeu a Folha para uma entrevista exclusiva.(Eva Joory)
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Folha – Por que decidiu fazer uma apresentação para pouca gente e fora das tendas do Bryant Park, onde todos os outros se realizaram?
Marc Jacobs – Por uma simples razão: não tinha dinheiro para alugar uma tenda. Também não gosto megashows, nem de multidão. Queria fazer algo mais intimista e resolvi convidar amigos e quem realmente valia a pena.
Folha – Você foi um dos primeiros a pensar nos jovens, com sua moda grunge há dois anos. Como você vê estilistas como Anna Sui e Donna Karan correndo atrás dos jovens hoje em dia?
Jacobs – Acho que a moda tem que ser necessariamente jovem, mas foi mais difícil desenvolvê- la com Perry Ellis. Todo mundo gosta de se sentir jovem, de se vestir com roupas jovens. Acho que nenhuma mulher gosta de usar somente roupas com look executivo. Olhe as garotas hoje, são jovens e gostam de se sentir atraentes. Eu também nunca me restringi a nada, gosto de cores, de mínis, de roupas sóbrias, loucas. Não me obrigo seguir tendências, sigo meu gosto
pessoal. Acho que aqui em Nova York, a moda é feita basicamente pelos jovens nas ruas. São eles os novos porta-vozes do que está acontecendo. Eles têm estilo, personalidade, são tão criativos. A rua é uma boa influência porque é onde estão os jovens e eles não têm mêdo, não estabelecem regras nem têm preconceitos.
Folha – Você acha que a moda americana está vivendo o seu melhor momento?
Jacobs – Não vejo muita diferença. A moda americana sempre existiu, não é uma novidade. Sem dúvida já foi mais conservadora, onde os nomes conhecidos eram de estilistas mais velhos e mais estabelecidos. Com a chegada de nomes mais jovens, isto se modificou, graças em parte à imprensa de moda como "Harper's Bazaar" e "Vogue" americana, que prestaram mais atenção aos novos. Hoje todo mundo presta mais atenção aos novos estilistas, coisa que há alguns anos não acontecia, por isso este hype todo.
Folha – Qual a diferença entre moda americana e moda européia?
Jacobs – Acho que sempre houve uma distinção; existem dois únicos lugares na América que influenciam o comportamento das pessoas, Nova York e Los Angeles. É dessas cidades que saem as tendências, tudo o que acontece nas ruas, o que os jovens estão usando. Esta é a diferença para com a moda de Paris ou Milão. É uma moda mais fechada, pouco preocupada com o que acontece nas ruas. Na Europa, os jovens têm estilo, mas não têm energia. Etiqueta e boas maneiras não interessam mais a ninguém.
Folha – O seu desfile mostrou que ainda é possível brincar com moda sem enlouquecer nas criações e sem toda este posicionamento de realidade e simplicidade. Concorda?
Jacobs – Acho que ambos podem existir. Estas pessoas estão tentando criar regras para si próprias. Acho que ainda se pode fazer roupas clássicas e brincar com elas. Mas cada um tem
seu estilo e isto vale tanto para o estilista quanto para as pessoas que vão usar suas criações. Passarela é passarela e realidade é realidade. Desfiles não significam nada até alguém comprar suas roupas. Como elas vão ser usadas é indiferente para mim.
Folha – Você tentou atingir um público maior nesta coleção?
Jacobs – Ao contrário. Não gosto de produzir inutilidades, minhas roupas não são baratas, por isso acho que tenho que ter mais cuidado, não quero fazer parte de uma roda-viva, fazendo merchandising com minhas roupas.
Folha - Como foi ter iniciado a moda grunge?
Jacobs – A idéia que certas pessoas tiveram em chamar minha moda de grunge me deixou maluco naquela época. Para mim não era grunge, eram simplesmente roupas de que eu gostava. Acho que o que incomodou as pessoas não foram as roupas, foi a atitude das modelos, que pareciam não se importar com moda, vestindo aquelas roupas com coturnos pesados. Fizemos roupas lindas, com cores e tecidos maravilhosos, com corte e acabamentos perfeitos. O que estas pessoas que trabalham com moda não entendem é a idéia de uma antimoda e antimoda é
moda na sua essência, é a mesma coisa. Eu estou sempre questionando tudo, não sou uma pessoa agressiva ou amarga. A ironia daquilas roupas era tão jovem e tão estranha que me senti atraído por aquilo.
Folha – Você mostrou roupas com corte perfeitos; você acredita em técnica?
Jacobs – Absolutamente, mas não acho que tanha havido um momento em que a técnica tivesse desaparecido. Existem tipos de técnicas, para roupas com cortes exatos e para outras mais leves. São técnicas diferentes.
Folha – Alguém falou que as coleções não estariam refletindo o inverno que vem por aí, com tantas mínis, pernas de fora, barrigas à mostra e decotes. O que você acha deste comentário?
Jacobs – O problema com gente que fala de moda é que quando as roupas são vistas na passarela, as pessoas respondem de uma certa maneira. Se para esta temporada de desfiles, fôssemos mostrar todo mundo coberto para o inverno, iria parecer pesado demais, pouco saudável. Estamos apresentando nossa coleção com dias de sol, então eu não quero que minhas modelos comecem a suar. Quando se sai à noite, mesmo no inverno, não se sai coberto da cabeça aos pés. É desconfortável ver um desfile com modelos cobertas, as pessoas acabam se
sentindo sufocadas.
Folha – Como você vê a moda hoje?
Jacobs – Acho que tudo virou uma indústria, algumas pessoas estão perdendo o foco e alguns estilistas estão fazendo roupas para lojas. Lojas não compram roupas para uso próprio, compram nas esperança de vendê-las para as mulheres. Temos que ver para quem estamos fazendo moda. No meu caso, faço, em primeiro lugar, para mim, e em segundo lugar, porque quero que alguém, alguma garota, compre e se identifique.
Folha – Você acha que o glamour é importante? É necessário para uma mulher ser sexy?
Jacobs – Faz parte da natureza humana querer se sentir atraente, se enfeitando ou não. Mas cada mulher tem uma idéia diferente do que é ser sexy. Não existe o certo e errado. Qualquer mulher está apta para criar esta emoção. Esta é a graça da moda, está sempre mudando e você pode mudá-la.
Folha – Qual a importância de ter todas as top models num só desfile?
Jacobs – É uma atração. Nós trabalhamos duro para criar e estas modelos são lindas, sabem fazer a roupa brilhar. No caso dos tops, estas meninas têm estilo, são como estrelas de cinema, mas com a diferença que são muito mais atraentes, sabem se produzir, têm bom gosto. Desfile é teatro, é Hollywood.

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