São Paulo, domingo, 17 de abril de 1994
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Maior estudioso da flora brasileira faz 200 anos

RICARDO BONALUME NETO

Maior estudioso da florabrasileira faz 200 anos
Eventos marcam bicentenário do naturalista Martius, que veio como 'dote' da imperatriz Leopoldina

Hoje se comemora uma efeméride bem redonda: há exatos duzentos anos nascia o sujeito que mais fez pelo conhecimento daquilo que é celebrado no verde da bandeira brasileira.
Em 17 de abril de 1794 um dos cientistas mais prolíficos do século 19, o botânico Karl Friedrich Philipp von Martius, veio à luz na cidade de Erlangen, na Baviera, sul do que hoje se chama Alemanha.
O trabalho de Martius (1794-1868) no Brasil foi um dos melhores resultados da união conjugal do primeiro imperador brasileiro.
Dom Pedro 1º recebeu como esposa a austríaca Maria Leopoldina Josefa de Habsburgo.
Como parte do "dote", o Brasil recebeu em 1817 uma comitiva de sábios europeus, entre os quais o jovem botânico Martius e um colega zoólogo, Johann Baptist von Spix.
A dupla viajou por três anos por São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Pernambuco, Maranhão, Piauí e, naturalmente, pelo ainda hoje paraíso dos naturalistas, a Amazônia.
Um resultado espetacular foi a maior obra já escrita sobre o país, e a mais importante sobre sua vegetação.
"Flora Brasiliensis" começou a ser publicada em 1840 e só foi terminada em 1906, vários anos depois da morte de Martius.
São 130 fascículos em 40 volumes, nos quais trabalharam 65 botânicos de diversos países europeus, liderados também por August Wilhelm Eichler e Ignaz Urban. Mais de 20 mil espécies vegetais são descritas na obra.
"Nenhum outro país pode orgulhar-se de possuir trabalho de tamanha envergadura sobre sua vegetação", disse da obra de Martius, Eichler e Urban o botânico brasileiro e professor emérito da USP Mário Guimarães Ferri.
Já não era sem tempo. Os luso-brasileiros tinham descuidado do conhecimento científico do país de uma maneira quase criminosa.
Boa parte do que se conhecia da história natural brasileira no começo do século 19 ainda era fruto do trabalho de pesquisadores a soldo dos holandeses, que dominaram parte do Nordeste no século 17.
E mesmo o trabalho de um pioneiro luso-brasileiro do século 18, Alexandre Rodrigues Ferreira, sofria de um defeito mortal: falta de divulgação.
No século 18 ou no 20, a máxima da ciência é a mesma: "publique ou pereça".
A botânica científica no Brasil começou com outro alemão, Georg Marcgrave (1610-1644), membro da comitiva do conde Maurício de Nassau, governador do Brasil holandês.
"Historia Naturalis Brasiliae" foi publicado em 1648, mas o livro e o herbário coletado pelo alemão foram fonte importante de algumas das monografias da obra editada por Martius.
Outro protegido de Nassau, o médico Wilhelm Piso (1611-1678), fez contribuições sobre plantas medicinais, tema caro a Martius anos depois.
O baiano Alexandre Rodrigues Ferreira viajou pela Amazônia e fez coleções de plantas e animais.
Ele é o símbolo perfeito da dedicação do pesquisador brasileiro ao seu país, e do descaso das autoridades locais com a ciência.
Fez estudos seminais, mas nunca viu sua "Viagem Filosófica" publicada. Pior: suas coleções botânicas foram saqueadas durante a invasão francesa de Portugal.
Além de botânico, Martius era poeta, e deixou conhecimentos importantes sobre etnografia.
Spix e Martius foram os primeiros naturalistas não lusos a viajar com permissão oficial pelos rios Negro e Amazonas. Com a independência brasileira, aumentaram as viagens de cientistas pelo país.
A obra do alemão Marcgrave, do século 17, era consultada com admiração pelos cientistas do século 19. Não há dúvida de que a obra de Martius, do século 19, ainda será consultada com respeito por cientistas do século 21.

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