São Paulo, segunda-feira, 25 de abril de 1994 |
Texto Anterior |
Próximo Texto |
Índice
Mário Soares defende herança do movimento
JAIR RATTNER
Mário Soares, 69, fez parte do grupo que fundou o Partido Socialista Português em 1963. Foi um dos políticos que tomou as rédeas do país quando o poder esteve na rua, no período conhecido como o Verão Quente de 1975. Advogado e formado em história, entrou para a política defendendo prisioneiros políticos. Soares já declarou que no fim do segundo mandato na Presidência –de 1991 a 1996– vai retirar-se para escrever livros. Ele foi chanceler e primeiro-ministro antes de ser eleito para a Presidência. Negociou a entrada de Portugal da Comunidade Européia, hoje União Européia. Folha - Como é que o senhor recebeu a notícia do 25 de abril? Mário Soares - Eu estava em Bonn, a convite do chanceler Willi Brandt, que era o presidente do Partido Social Democrata alemão. Quando soube da revolução, comecei com telefonemas para toda a parte. Contatei Lisboa e disseram que efetivamente era uma revolução, mas que a situação ainda era muito confusa. Eu imediatamente fui para a França e, como o aeroporto de Lisboa estava fechado, vim de trem e cheguei dois dias depois. Folha - O senhor achou inicialmente que era um golpe de direita ou democrático? Soares - Quando eu parti de Paris já estava convencido de que o golpe era democrático, visto que já tinham posto em liberdade uns tantos presos políticos. Folha - Uma das consequências do 25 de abril foi a descolonização, que não garantiu o fim da guerra para Angola e Moçambique e também não garantiu a democracia nas ex-colônias. Soares - A situação na África é toda ela terrível. Desde a Abissínia, passando pela Somália, pela Argélia, descendo à África do Sul, toda a África, sem exceção, seja anglófona, francófona ou lusófona, está à deriva. Não se pode atribuir isso à maneira como foi feita a descolonização. A descolonização portuguesa foi a possível. Portugal estava quase à beira da guerra civil e depois de 15 anos de guerra colonial. Folha - O senhor afirmou recentemente que defende a Constituição dos Estados Unidos da Europa. Não existe a possibilidade do fim da nacionalidade portuguesa em favor de uma nacionalidade européia? Soares - Não tenho nenhum receio quanto a isso. Portugal é um país que tem quase nove séculos de história, com uma altíssima e velhíssima cultura, uma identidade única e com uma unidade nacional extraordinária. Não temos problemas linguísticos, problemas religiosos, nem problemas regionais. Nós queremos participar da Europa e os problemas da nacionalidade não se vêem como no século 19. Se o Banco da Alemanha muda as taxas de juros, todos nós temos de mudar. Onde está a soberania? Isto é uma grande demagogia e uma grande hipocrisia daqueles que falam que querem preservar a nação não entrando na Europa. É exatamente o contrário. Nós podemos nos preservar e garantir melhor estando ativamente integrados num grande espaço coletivo e democrático. (JR) Texto Anterior: Movimento se dividiu, diz líder Próximo Texto: Sérvios começam retirada de Gorazde Índice |
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress. |