São Paulo, domingo, 8 de maio de 1994
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A ameaça da ignorância

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Pode parecer piada, mas não é. A ignorância é capaz de comprometer o plano econômico a ser deslanchado com a introdução da nova moeda –o que terá efeitos na sucessão presidencial. Isso porque, por incrível que pareça, muita gente que tem caderneta de poupança não sabe o que é inflação.
O Ministério da Fazenda e o Banco Central avaliam que, com a introdução do Real, a inflação vai despencar. Quem tiver caderneta de poupança não vai ganhar, ao final do mês, 50%. O rendimento pode não passar dos 3%. Ou menos.
Muita gente vai ter a sensação de que, agora, não vale a pena manter sua poupança –afinal, "só está rendendo 3%". Não entenderam que, na prática, é a mesma coisa que o rendimento de 50%. Afinal, o que vale é o poder de compra e não o volume de notas de bolso. É o que se chama de ilusão monetária. E, aí, mora o perigo.
Calcula–se no governo que, devido a essa ilusão, exércitos de consumidores vão tirar o dinheiro da poupança e sair comprando. Numa previsão otimista, técnicos do governo imaginam que entrarão nas lojas, rapidamente, US$ 1,2 bilhão.
Resultado: pressão nos preços combinada com a falta de produtos. Se a queda da inflação certamente produziria efeitos positivos na candidatura Fernando Henrique Cardoso, as prateleiras vazias municiam os adversários.
É certo que, desta vez, o governo está mais atento do que no Plano Cruzado e vai usar, segundo o ministro Rubens Ricupero, todos os artifícios para evitar uma febre de consumo. Se vai conseguir, é outro problema. Mais uma vez, se vê que a deseducação é o problema que mais sai caro ao Brasil.
PS – Realmente é notável a evolução de Lula nos últimos 15 anos. Recebi ontem por fax entrevista que ele concedeu em 1979 para a revista "Especial", onde expõe sua visão sobre a mulher. Reproduzo uma frase: "A gente não pode pensar em jogar a mulher no mercado de trabalho enquanto houver excesso de mão-de-obra". Aliás, nessa entrevista ele, corretamente, defende a legalização do aborto com argumentos razoáveis e, agora, por motivos eleitoreiros, cedeu à pressão da Igreja Católica.

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