São Paulo, sábado, 21 de maio de 1994 |
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Ópera sai do campo de concentração
LUÍS ANTÔNIO GIRON
Voltam à cena e recebem primeiras gravações óperas, sinfonias e peças de câmara de autores como Berthold Goldschmidt, Krenek, Korngold, Ullman e Schulhoff. Ilustres pelo anonimato compulsório que granjearam durante a política cultural do ministro da propaganda nazista, Joseph Goebbels, eles passam agora a ser considerados autores de obras essenciais do século 20. À frente da revivescência da tradição extraviada está a gravadora inglesa Decca. Ela lançou em abril do último ano a coleção de CDs "Entartete Musik" (Música Degenerada), com obras catalogadas como "degeneradas" na exposição "Entartete Musik" em 1938. A série já tem sete CDs lançados. Os dois primeiros chegam agora ao Brasil, via importação da Polygram: as óperas "Jonny Spielt Auf" ("Jonny Arrasa"), de Ernst Krenek (1900-1991), e "Das Wunder der Heliane" (O Milagre de Heliane), de Erich Wolfgang Korngold (1897-1957). Os intérpretes da coleção são quase todos da ex-Alemanha Oriental. A Orquestra Sinfônica da Rádio de Berlim e a Gewandhaus de Leipzig, regidas por John Mauceri e Lothar Zagrosek, dão conta de "Heliane", "Flammen" (Chamas), de Erwin Schulhoff, morto em 1944 num campo de concentração, a sair em setembro deste ano, e "Der Gewaltige Hahnrei" (O Poderoso Cornudo), de Berthold Goldschmidt, 91. As duas últimas óperas saem até setembro, data em que a de Goldschmidt estréia em Berlim (leia texto ao lado). "Queremos trazer à luz obras de arte condenadas pelos nazistas por haverem apoiado a pluralidade cultural", diz o idealizador da coleção, o francês Didier de Cottignies, vice-presidente da Decca. Segundo Cottignies, os músicos e pesquisadores da Decca estão realizando três trabalhos: redescobrir obras importantes, colocá-las no mercado, animar suas encenações e renovar o repertório. Lançamentos se dão até 1995. Ele acha que o público cansou de romantismo e vanguarda do pós-guerra. "O mercado da música erudita se viciou em gravar a mesma coisa. Provamos que há outras obras interessantes." Krenek, Korngold e Goldshmidt eram figuras de ponta na cultura das duas cidades européias mais fervilhantes da época: Viena e Berlim. Viram suas obras banidas. "Heliane" e "Jonny" estrearam na Ópera de Viena na temporada de 1927. "Hahnrei" em Mannheim (Alemanha) em 1932. Korngold quis realizar a mais complexas das óperas super-românticas vienenses e foi um fracasso. O enredo mitológico não agradou. Mas os nazistas só o expulsaram da Áustria (anexada em 1938) porque era judeu. Krenek fez furor e "Jonny". A ópera misturava jazz e dodecafonismo e contava a história de amor entre um músico negro de jazz e uma mulher branca. Foi representada em mais de cem casas européias na época e logo esquecida. Com a coleção, as óperas estão sendo reabilitadas pelos teatros. "É impossível entender o século 20 sem essas obras que pregam tolerância e democracia", diz Cottignies. "Precisamos eliminar a influência cultural que o nazismo ainda exerce em nosso meio." Coleção: Entartete Musik (Música Degenerada) Discos: Jonny Spielt Auf (Jonny Arrasa) (2 CDs), ópera de Ernst Krenek, Das Wunder der Heliane (O Milagre de Heliane) (3 CDs), de Korngold Intépretes: Orquestra da Gewandhaus de Leipzig, regência de Lothar Zagrosek, com Alessandra Marc (Anita), Krister St Hill (Jonny) e outros (Jonny Spielt Auf); Sinfônica da Rádio de Berlim, regência de John Mauceri, Anna Tomowa-Sintow (Heliane) e outros (O Milagre de Heliane) Próximos: Der Gewaltige Hahnrei (O Poderoso Cornudo), ópera de Bertold Goldschmidt, com RSO de Berlim, regência de Zagrosek; Der Kaiser von Atlantis (O Rei de Atlantis), ópera de Viktor Ullman, Gewandhaus, Zagrosek; Quartetos, de Krása e Haas, com quarteto Hawthorne; Die Gezeichneten (Os Ilustrados), ópera de Schreker, RSO, Zagrosek; Flammen (Chamas), ópera de Erwin Schulhoff, RSO Lançamentos: Decca/Polygram Preço: 20 URVs (o CD, em média) Produtor: Didier de Cottignies Próximo Texto: COMPOSITORES BANIDOS PELO 3º REICH Índice |
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