São Paulo, domingo, 29 de maio de 1994
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`Estrutura política do Brasil é um desastre'

ANTONIO CARLOS SEIDL
DA REPORTAGEM LOCAL

Erramos: 18/06/94

Diferentemente do que foi publicado nesta reportagem, a região da Califórnia, nos Estados Unidos, onde se concentram as indústrias de computadores é conhecida como Vale do Silício. `Estrutura política do Brasil é um desastre'
A estrutura política do Brasil é "um desastre", disse o escritor e futurista norte-americano, Alvin Toffler, 64, em entrevista à Folha.
Para ele, isso não é resultado dos escândalos de corrupção, mas sim do fracasso dos políticos em negociarem um projeto nacional para reduzir as desigualdades sociais e econômicas no país.
Toffler é autor de "As Três Ondas", lançado em 1980, nos EUA, que já vendeu mais de 10 milhões de exemplares em 25 idiomas.
Ele fará palestra amanhã em Curitiba, no 2º Congresso de Marketing do Cone Sul.
Por telefone, de seu escritório em Los Angeles, Alvin Toffler deu a seguinte entrevista à Folha.

Folha - Qual será o tema de sua conferência no 2º Congresso de Marketing do Cone Sul?
Alvin Toffler - O Brasil faz parte da economia mundial e a questão que vou analisar é o que está acontecendo na economia global e na estrutura política global na qual o Brasil se encaixa.
Folha - O sr. pode adiantar um pouco os detalhes de sua conferência?
Toffler - O sistema geopolítico global, até agora, foi composto de nações e de instituições globais, todas baseadas em nações.
No próximo século, as nações não vão ser mais os atores dominantes na cena global porque estão começando a surgir novos tipos de organismos econômicos, novos movimentos religiosos, novos sindicatos criminais e novas formas de poder militar.
Quando chegarmos ao século 21, a ordem global será muito diferente do que é hoje e o Brasil tem que imaginar como vai se encaixar neste novo sistema.
Folha - O sr. está otimista em relação ao futuro?
Toffler - Sempre tivemos em nossos livros, Heidi, minha esposa, e eu, uma visão agridoce do futuro. O futuro não será otimisticamente maravilhoso. Será diferente, não necessariamente melhor, não necessariamente pior.
Terá a combinação humana comum de coisas bonitas e coisas horrorosas, mas será diferente. A principal diferença será essa transformação na natureza da produção econômica.
A mudança da produção em fábricas para a produção baseada na informação. Quando isso acontecer, trará junto mudanças, não apenas na economia, tecnologia e negócios, mas também nas instituições sociais, estrutura familiar, idéias e valores.
Folha - Como o sr. avalia a atual situação do Brasil?
Toffler - Os brasileiros sabem muito bem qual é o problema do Brasil. Tudo vai para frente exceto a política. A estrutura política é um desastre. Não é apenas o fato de que há corrupção no Brasil, porque também há corrupção na Itália e no Japão, por exemplo. Mas o problema no Brasil é agravado pelas desigualdades sociais e crise econômica.
Folha - Qual sua receita para a resolução desses problemas?
Toffler - Não sou um especialista em Brasil. E não penso que um norte-americano qualquer possa chegar ao Brasil e apresentar uma cura mágica para o país. O que torna a situação realmente complexa no Brasil, talvez mais complexa do que em outros países, é o que chamo tecnicamente de as ondas de desenvolvimento.
O Brasil é um dos poucos países em que as três ondas existem simultaneamente: na primeira onda, a atividade agrícola de subsistência persiste nas regiões mais pobres.
A segunda onda é a sociedade industrial de São Paulo e região sul, onde prevalece a indústria tradicional.
A terceira onda é a indústria de computadores e a utilização de satélites de comunicação que surge na esteira da abertura do mercado de informática.
Folha - Quais são as implicações da simultaneidade das três ondas de desenvolvimento?
Toffler - Cada tipo de onda é associado a um certo grupo político e social. Eles são a elite rural, a elite industrial e a elite da informática. Esses grupos não têm os mesmos interesses.
E sabemos, pela história, que todos os países que passaram pela industrialização testemunharam o conflito entre a elite rural, com seus latifundiários, e os industrialistas. Esse conflito ainda existe no Brasil.
E o país tem agora o começo da população da terceira onda cujos membros, cultural e cientificamente melhor preparados, têm mais em comum com as pessoas do "Vale do Silicone" (nome dado à área onde se concentram as indústrias de computadores dos EUA, na Califórnia) do que com seus conterrâneos pobres do Nordeste.

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