São Paulo, domingo, 12 de junho de 1994
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Universidade - investimento com retorno assegurado

ARTHUR ROQUETE DE MACEDO

Nesta seção Tendências/Debates de 04/06/94, levantou-se, mais uma vez, a questão dos recursos estaduais destinados às universidades públicas paulistas.
Diante da pergunta "Os recursos estaduais destinados às universidades públicas paulistas devem aumentar?", os três articulistas parecem convergir para o Não, pois concordam que os atuais recursos são suficientes.
Há 30 anos na universidade pública e nesses dez últimos anos com a responsabilidade de exercer a administração universitária, não posso deixar de me manifestar. E começo por afirmar que, sim, as universidades públicas paulistas necessitam de aumento dos recursos estaduais que lhes são destinados.
Os recursos atuais estão aquém das necessidades que garantam a manutenção da qualidade de seus serviços e, muito aquém, dos projetos existentes para melhoria dessa qualidade.
Por sua natureza mesma, as universidades são um projeto social universalmente válido, sem equívocos, mesmo que visões equivocadas sejam objeto de sua própria cultura e, sejamos redundantes, de seu cotidiano exercício crítico. Não tenho dúvidas quanto à necessidade de mais recursos; também estou convicto do retorno positivo de sua aplicação em benefício da sociedade.
As universidades estaduais paulistas têm demonstrado ser das poucas instituições com credibilidade, competência e compromisso social, empenhadas na elaboração de um projeto de desenvolvimento permanente. Constitui cegueira não perceber isso. E é visão distorcida não querer aceitar essa prioridade.
Ao mesmo tempo, são visivelmente inoportunas as avaliações apresentadas sobre as universidades públicas paulistas, neste momento em que minorias não representativas de suas comunidades tentam paralisar, por meio de ações radicais e irresponsáveis, atividades da maior importância para a sociedade.
As universidades estaduais paulistas constituem um fator exponencial na construção do país: são responsáveis pela formação dos recursos humanos de melhor qualificação em virtude do valor incontestado dos seus cursos de graduação, de serem responsáveis por cerca de 400 programas de pós-graduação e ministrarem os cursos mais concorridos de aperfeiçoamento e extensão.
Respondem por mais de 55% da produção científica brasileira, num universo de centenas de universidades e instituições de pesquisa; possuem os melhores laboratórios e bibliotecas e contam com doutores em número e qualidade só encontrados no Primeiro Mundo.
Outro aspecto a ser ressaltado é a imprescindível atuação na área de extensão de serviços à comunidade. As universidades estaduais paulistas mantêm, com orçamento próprio, quatro hospitais que constituem suporte indispensável ao combalido sistema nacional de saúde.
Este é apenas um exemplo dentre tantos que vão da ciência social à agropecuária, da psicologia à informática. A maioria dos projetos em curso no país conta com a participação direta da universidade ou de seus docentes.
Mais recentemente, a aproximação com o setor produtivo privado e com prefeituras municipais tem merecido atenção especial. Esse processo caminha de forma gradual mas consistente. Desconfianças mútuas e dificuldades operacionais têm sido vencidas.
Hoje estão em andamento centenas de projetos de transferência de tecnologia da universidade para a sociedade, cuja relação custo/benefício na maioria das vezes é impossível de se aferir.
Alguns exemplos: quanto a sociedade lucrará com a instalação do centro de computação de alto desempenho na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas)? Qual será o montante que o Brasil ganhará no rico e disputado comércio internacional de sucos com a superlaranjeira, desenvolvida nos laboratórios da Unesp (Universidade Estadual Paulista), cuja produção de cada árvore será dez vezes maior do que a média paulista? Qual o valor dos avanços de toda ordem promovidos pela USP no campo da medicina?
Portanto, "as universidades não estão fazendo o que sempre fizeram". Ao contrário, vem ocorrendo uma permanente e significativa ampliação de sua função social apesar da forte recessão que diminui seus orçamentos.
Com a queda ocorrida na arrecadação do ICMS nos últimos cinco anos, os 9% a ela destinados representam hoje, em valores reais (taxa cambial mensal do dólar), 19% a menos que em 1990, quando o percentual era de 8,4%.
Por essa razão, e em função das prioridades desenvolvidas na Unesp, Unicamp e USP, defendo, em uma análise global, a elevação do percentual da arrecadação do ICMS a elas destinado.
Por fim, gostaria de relembrar o apoio que as nossas universidades recebem da sociedade paulista como um todo. Tal apoio constitui sinal de credibilidade pública e é fruto do reconhecimento do trabalho realizado por professores, alunos e técnicos universitários para intensificar e aperfeiçoar a educação, a ciência, a tecnologia, a cultura.
Pode ser que os resultados desse trabalho não sejam imediatamente visíveis, nem nos parece função da universidade apregoá-los a toda hora. Mas podem ser sentidos pelos que não se encastelam em gabinetes e estão abertos às transformações e aos problemas reais.
Estes têm diante de si as provas de que a preservação e a melhoria das universidades são prioridade nacional.
O Estado de São Paulo não pode deixar que um patrimônio da grandeza de suas três universidades caia, isso sim, na vala comum do simplismo político e do discurso acadêmico-populista.
Ao mesmo tempo, não poderá permitir que a autonomia e a democracia construídas pela comunidade universitária sejam ameaçadas por atitudes corporativistas e radicais.

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