São Paulo, quinta-feira, 16 de junho de 1994
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Carente de heróis, o país precisa da vitória na Copa

VICENTE AMATO NETO

OPINIÃO
Carente de heróis, país precisa da vitória na Copa
A sorte está lançada. A equipe brasileira que disputará a Copa do Mundo, a mais importante competição esportiva no contexto do futebol, já se encontra nos EUA, compondo plêiade cercada de organização e apoio técnico profissional experiente e respeitável. O grupo de convocados suscita alguns debates, mas é lícito reconhecer que eles apenas dizem respeito a detalhes.
Em determinadas disputas, ocorreram deslizes, impropriedades e inadequações, agora sem dúvida não proeminentes. Em 1938, os jogadores somente "fizeram ginástica" no convés do navio e o técnico, em treinos, inverteu todas as posições para enganar os adversários. Felizmente, parece que evoluímos.
Precisamos da vitória. No Brasil, estamos presentemente sem heróis, líderes e paradigmas, em múltiplos afãs. Além disso, governantes agem sem programas e muitíssimos políticos mostram despreparo e personalismo, impedindo a concretização de bons projetos preparados por cidadãos dedicados, abnegados e dispostos a colaborar efetivamente. Não bastasse tudo isso, há desbragada corrupção nas atividades de bom número de órgãos governamentais, ocorrendo outrossim, no âmbito da comunidade, ganância, imoralidade, violência, desejo de levar vantagem em tudo, precária situação, sanitária, saúde pública descuidada ou descaso quanto ao ensino em vários níveis, ao lado de inúmeras coisas desprimorosas, gerando tristeza, decepção e contrariedade, a despeito das credenciais que a nação tem.
Essas mazelas contrapõem-se à potencialidade do país, respaldada no extenso território, nas riquezas naturais, nas belezas existentes e na capacidade de muitíssimos habitantes. Tal panorama cria condições para que precisemos de alguns sucessos, que hoje quase só advêm da área esportiva. Faltam figuras exponenciais nos campos científico, literário, artístico e cultural de um modo geral, se valorizarmos o que ultrapassa fronteiras e orgulha-nos.
Êxitos marcantes têm vindo praticamente só de praticantes de determinadas modalidades esportivas e, mesmo assim, começaram a rarear. Tenistas e membros do atletismo, apesar da intensa ajuda da imprensa, causam no momento contínuos desgostos e exibem decadência. A propósito do basquete e do voleibol chegamos a contar ocasionalmente com bons augúrios. Todavia, perdemos recentemente vitorioso expoente: Senna morreu e ficamos privados de instantes de glória, nos quais, após sucessos, víamos a bandeira brasileira dele exibida ao mundo e emoldurada por grande quantidade de outras; com lágrimas nos olhos sentíamos orgulho da nossa brasilidade, verdadeira, viável e nunca dígna de esmorecimento. Nesta época plena de amargura, inegavelmente almejamos o triunfo que a seleção pode conseguir na próxima Copa, apto a revelar que o Brasil é valoroso, capaz e aguerrido. Para os críticos dessa postura, alegando que futebol não pode ser instrumento de patriotísmo, peço comportamento substitutivo de indicador esportivo em tela.
Futebolistas brasileiros: por favor tragam a taça, símbolo presentemente raro das virtudes de um povo traído e desrespeitado. E que o resultado feliz estimule os bens dotados a tentarem reverter a melancólica condição em vigor.

Texto Anterior: Conheça a carreira como jogador de 21 técnicos da Copa dos EUA
Próximo Texto: Alemanha sai em busca do tetra
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.