São Paulo, domingo, 19 de junho de 1994
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TRECHOS

"O amor transfere ao corpo os atributos da alma e esta cessa de ser uma prisão. O amante ama o corpo como se ele fosse uma alma e a alma como se ela fosse um corpo. O amor mistura a terra ao céu: ele é a grande subversão. Cada vez que o amante diz: eu te amo para sempre, ele confere a uma criatura efêmera e mutável dois atributos divinos: a imortalidade e a imutabilidade. A contradição, na verdade, é trágica: a carne se corrompe, os nossos dias estão contados. No entanto, nós amamos. E nós amamos com o corpo e com a alma, de corpo e alma."
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"Nós não somente sabemos que vamos morrer, mas ainda que o ser amado também vai morrer. Somos os joguetes do tempo e dos seus acidentes: a doença e a velhice, que desfiguram o corpo e desorientam a alma. Mas o amor é uma das respostas que o homem inventou para olhar a morte de frente. Pelo amor nós roubamos ao tempo, que nos mata, algumas horas que ora transformamos em paraíso, ora em inferno... Para além da felicidade e da infelicidade, o amor, tanto sendo um quanto outro, é intensidade; ele não nos propicia a eternidade, mas a vivacidade, o minuto durante o qual se entreabrem as portas do tempo e do espaço: aqui é lá e agora é sempre. No amor, tudo é dois e tudo aspira a ser um."

Extraído de "A Chama Dupla"

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