São Paulo, quinta-feira, 23 de junho de 1994
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Surpresas e delírios

CARLOS HEITOR CONY

RIO DE JANEIRO – Mais uma vez, os fiéis do "bispo" Macedo deram um espetáculo de massa: a multidão de devotos ocupou, no último sábado, o imenso espaço do Monumento aos Mortos da 2ª Guerra Mundial –fato que gerou cobranças e questionamentos suplementares.
Ali ou no Maracanã pouco importa: já me avisaram que, antes da virada do século, será construído um tablado cobrindo toda a baía de Guanabara para abrigar a multidão que cresce a cada dia. Descrendo da possibilidade técnica para tão imenso tablado, admito a possibilidade da multidão dos seguidores do "bispo".
O fenômeno não é novo. Todas as grandes religiões e seitas que hoje definem ou servem de referência às civilizações criadas (cristianismo para o Ocidente, taoísmo para o Japão, islamismo para os árabes), todos esses movimentos começaram mais ou menos assim.
Os primeiros cristãos de Roma eram escravos, mendigos, marginais. Foi, talvez, o maior movimento de baixo para cima da história: as primeiras patrícias que se converteram foram levadas à nova seita pelas suas escravas. Suetônio chega a acusar os "partidários de um tal de Crestos" de promover tumultos –a citação desse tal de Crestos é a mais antiga da literatura oficial a respeito de Cristo.
Além de formar a escória social do Império, os partidários do tal Crestos eram subversivos. Nada de admirar que dez dos maiores imperadores de Roma tivessem como prioridade a destruição do nome dos cristãos –a coluna de Trajano lá está, até hoje, lembrando a destruição daqueles que acabariam destruindo o Império Romano.
Pode parecer loucura comparar os seguidores do "bispo" Macedo com os cristãos primitivos. Não conheço em detalhes as seitas evangélicas, mas não é difícil perceber o que elas prometem: curas, felicidade, saúde, prosperidade e castigo para os maus e ímpios. Numa palavra: o mesmo que todas as religiões, com pequenas variantes, pregam e oferecem.
Outro dia, num jantar, para escândalo do Zé Aparecido e do Marcito Moreira Alves, disse que felizmente não ressuscitaremos daqui a 20 séculos. Teríamos muitas e desagradáveis surpresas.

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