São Paulo, terça-feira, 5 de julho de 1994
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Ensinando a pescar

JOSÉ SERRA

"Se dás um peixe a um homem, ele poderá se alimentar uma vez. Se o ensinas a pescar, ele se alimentará toda a vida."(Kuan-Tzu)²

É óbvio que o seguro-desemprego não diminui a taxa de desocupação da mão-de-obra e que a escassa qualificação média dos trabalhadores brasileiros não é a única nem a principal causa do elevado desemprego da economia.
Ainda assim, o referido seguro é tão indispensável quanto a aspirina que alivia a dor de um paciente, até que a causa básica da enfermidade possa ser removida. E se é combinado com um programa de reciclagem profissional, ainda melhor, porque facilita ao trabalhador desempregado obter novo posto de trabalho, nestes tempos de revolução tecnológica e reestruturação administrativa das empresas.
Por isso é muito importante a lei de minha autoria que o Congresso aprovou e o presidente Itamar Franco promulgou na semana passada, remodelando o Programa do Seguro-Desemprego. A lei aumenta o número de parcelas pagas aos desempregados que trabalharam nos últimos dois anos de quatro para cinco meses. Este período poderá chegar em certos casos a sete meses, quando o Codefat (Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador) assim o decidir, em face de crises setoriais na economia. A lei melhora também as condições de acesso ao programa.
O desempregado não precisará mais demonstrar que trabalhou 15 meses nos últimos dois anos, bastando comprovar que teve carteira assinada nos últimos seis meses. Isto já era permitido pelo "seguro de emergência" (também de minha autoria), mas agora incorporou-se à lei permanente.
A nova lei foi mais longe ainda, ampliando as funções do programa e permitindo que os trabalhadores em geral –desempregados e empregados– possam receber treinamento profissional e, quando for o caso, ajuda na procura de nova ocupação.
Trata-se de mudança importantíssima, que há muito vinha sendo discutida no âmbito do Ministério do Trabalho, no Codefat e em diversos fóruns sobre políticas de emprego. Essa mudança permitirá que o programa passe a contemplar um conjunto integrado de ações de apoio ao trabalhador, voltadas não apenas para a proteção financeira do desempregado no momento da demissão, mas também para a prevenção e redução do próprio desemprego, através da reciclagem profissional e da intermediação na procura de novo posto de trabalho.
Para ser implementada, tal mudança exigirá a organização de um sistema público de apoio ao emprego, que, além da União, deverá ser integrado pelos governos estaduais e municipais e por instituições privadas de formação profissional, como o Senai e o Senac.
É evidente que um trabalhador atualizado e melhor qualificado tem mais possibilidades de manter-se em seu emprego, ou de conseguir nova colocação, ou mesmo de montar sua própria microempresa.
Assim, com as modificações garantidas pela nova lei, o Programa de Seguro-Desemprego brasileiro se aproxima dos modernos sistemas de seguridade social dos países desenvolvidos –e, curiosamente, do milenar e saudável ensinamento chinês de que, para alimentar um homem faminto, melhor do que dar-lhe um peixe, é ensiná-lo a pescar.

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