São Paulo, quinta-feira, 21 de julho de 1994
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A vertigem Bisol

HÉLIO BICUDO

Nas próximas eleições presidenciais, o candidato à Vice-Presidência poder-se-á constituir, mais do que nos pleitos anteriores, em condição positiva para o pleiteante à chefia do governo, numa eleição casada, como prevê a Constituição Federal.
E, da mesma sorte, tal seja o perfil do candidato à vice, poderá trazer perdas a se traduzirem numa queda vertiginosa nas preferências do eleitorado, sendo fatal para qualquer candidato que aspire a vitória.
É que o eleitorado, com as duas últimas experiências –o acesso dos vices José Sarney e de Itamar Franco à Presidência–, passou a entender que não basta saber quem é o candidato à Presidência, mas, por igual, qual o perfil do vice que se apresenta na mesma chapa, pois –e isto já aconteceu nos dois últimos episódios– o vice é e pode ser novamente convocado a exercer o mandato que venha a vagar por qualquer circunstância eventual.
Hoje, mais do que nunca, é irretorquível que o povo não aceita mais votar em hipóteses, mas em homens que representem um novo padrão ético e moral. Basta constatar-se que, nas pesquisas de opinião, a honestidade do candidato aflora como a principal condicionante para o exercício do cargo eletivo, seja ele qual for.
Sob esse ângulo é que convém analisar a candidatura do senador José Paulo Bisol a vice-presidente na chapa apresentada –com o Lula como presidente– pela Frente Brasil Popular.
Essa candidatura já se mostrava problemática antes mesmo de seu lançamento. Porque a conduta adotada pelo senador nas investigações promovidas pela CPI instaurada para averiguar irregularidades na Comissão de Orçamento do Congresso Nacional criou toda uma série de atritos desnecessários, que foram ecoar até mesmo nos gabinetes militares, ao alardear-se a instituição de um governo paralelo, como se isso fosse possível, pelas empreiteiras de obras públicas...
Ora, esses atritos não encontrariam acomodação numa sua candidatura majoritária, mas clara irritação por parte de quantos, no quadro político institucional, indiscriminadamente, se viram atingidos pelas diatribes do senador, ainda que qualificadas pelas melhores das intenções.
Nome nacional, Lula não precisaria buscar fortalecer sua candidatura, pois nome nacional maior do que o seu inexiste no quadro político atual.
O desafio da apresentação do nome do senador Bisol ensejou e está ensejando toda uma série de críticas relativas às qualidades imprescindíveis e que devam adornar o nome de um candidato que poderá vir a ser presidente.
Não tem apelo a consideração de que se trata de fatos ou de fatos descaracterizados para mistificar a opinião pública e, assim, desmerecer a candidatura do PT à Presidência. Já se disse e com muita sabedoria, que em política mais vale a versão que o fato.
Ora, é legítima a posição da coligação, quando pede espaço aos meios de comunicação para a defesa do senador José Paulo Bisol. Mas o mal já está feito e não é possível conduzir-se o processo eleitoral em curso tendo como tônica a defesa da honorabilidade de um dos candidatos em detrimento de seus temas centrais. A coligação fez o que lhe competia, na tradição bem sua de respeito aos direitos das pessoas.
Resta, entretanto, que uma reflexão mais profunda, além do mero respeito às formalidades e até mesmo à fidelidade partidária, leve o candidato a uma decisão que não respeita apenas à sua pessoa, digna, como todo cidadão, de todo o respeito, mas que dela extrapola para impedir o avanço das classes populares em direção ao governo da República.

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