São Paulo, domingo, 24 de julho de 1994
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TRT confirma reintegração de soropositivos no emprego

EUNICE NUNES
ESPECIAL PARA A FOLHA

A Justiça começa a consolidar uma posição em relação aos trabalhadores demitidos por serem portadores do vírus da Aids: se ficar comprovada a discriminação na demissão, a empresa deve reintegrar o demitido.
Esta tendência já estava delineada na Justiça do Trabalho de primeira instância e começa a ser confirmada em segunda instância.
Em São Paulo já são duas as decisões proferidas pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região, que julga as ações propostas em São Paulo e Santos.
A última decisão é de 6 de junho e foi proferida pela Sétima Turma do TRT, por unanimidade. Os juízes declararam nula a rescisão do contrato de trabalho e determinaram a reintegração.
Segundo o acórdão (decisão de segunda instância), a reintegração deverá incorporar todas as vantagens salariais obtidas pela categoria enquanto durou o afastamento.
Além disso, o demitido tem direito a todos os salários, férias, décimos-terceiros e depósitos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) referentes ao tempo em que ficou afastado e até o início do efetivo recebimento de auxílio-doença, pago pelo INSS.
Para os juízes, quando o empregado já manifesta os sintomas da Aids, a dispensa sem motivo justo, mesmo não comprovada a discriminação pela doença letal, é vedada. É que isso impede o recebimento de auxílio previdenciário.
"O empregado gravemente enfermo, com doença letal em desenvolvimento, não pode ser demitido. O artigo 476 da CLT (veja quadro ao lado) é claro ao informar que o empregado que está em auxílio-doença é considerado em licença não remunerada. Não se diga que o demitido não estava em seguro-doença, uma vez que a empresa impediu a obtenção desse benefício quando o demitiu".
O primeiro julgamento coube à Segunda Turma do TRT, em 21 de fevereiro deste ano. Por maioria de votos (houve um voto vencido), foi determinada a reintegração do trabalhador e o pagamento dos salários durante o afastamento.
Os juízes concluíram que, embora a lei não fale em estabilidade no emprego para doentes incuráveis, a Constituição protege a relação empregatícia contra despedida arbitrária ou sem justa causa.
"Doença não configura justo motivo para dispensa. O empregado doente tem direito à licença para tratamento, recebimento do auxílio-doença e até aposentadoria por invalidez", diz a decisão.
O juiz vencido concordou que houve discriminação na dispensa do empregado soropositivo. Mas alegou que a empresa pagou a indenização trabalhista devida e que a Constituição não prevê a estabilidade do doente no emprego.
O Grupo de Apoio e Prevenção à Aids de São Paulo (Gapa-SP) tem patrocinado inúmeras ações de portadores do HIV. Na Justiça do Trabalho, de 92 até maio de 94, foram propostas 220 ações.
"Nós fazemos uma seleção dos casos, para saber se a empresa agiu de forma discriminatória na demissão. Se concluirmos que houve discriminação, pedimos a reintegração", diz Aurea Celeste Abbade, presidente do Gapa-SP.
Ela conta que muitas empresas afastam do trabalho o portador de HIV (vírus da Aids), continuam a pagar os salários, mas acabam induzindo o empregado à demissão.
"Dizem que seria bom para ele ser demitido, pois receberia o FGTS, mais indenização compensatória (40% do valor total do FGTS). E acabam convencendo-o a aceitar a dispensa", diz Aurea.

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