São Paulo, sexta-feira, 29 de julho de 1994
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UTI indesejável

O governo prepara-se para cometer o grave equívoco de conceder socorro a instituições financeiras que estejam em dificuldades. Por qualquer ângulo que se analise a questão, esse tipo de subsídio é inaceitável.
Em primeiro lugar, é preciso deixar absolutamente claro que os bancos comerciais ditos varejistas (aqueles que operam com o público em geral) não enfrentam dificuldade alguma. Estão absolutamente sólidos e fizeram todos os ajustes necessários para enfrentar a relativa redução de lucros decorrente da queda do "floating" (ganhos em virtude da aplicação do dinheiro que fica parado nas contas).
Tampouco a esmagadora maioria das instituições financeiras que trabalham apenas com investimentos tem problemas sérios de liquidez. As únicas que conhecem dificuldades são aquelas que fizeram apostas excessivamente arriscadas no período da URV, criada pelo governo exatamente para que o mercado se preparasse para a chegada do real, a nova moeda.
Não se trata, portanto, de supor que a eventual quebra de uma ou outra instituição vá provocar prejuízos para uma clientela ampla e desavisada. Todos os que entraram nessas apostas, como banqueiros ou como investidores, sabiam perfeitamente o que estavam fazendo e os riscos que corriam.
Quase todas as empresas estão enfrentando dificuldades financeiras nesse período de juros excessivamente elevados, de liquidez firmemente contida em consequência do compulsório de 100% imposto pelo governo e de virtual paralisia dos negócios. Se cada uma dessas empresas tiver direito ao mesmo socorro financeiro que o governo quer conceder a instituições financeiras, nem todo o Orçamento da República será suficiente.
O país vive há tempo demais sob regras que distorcem o livre mercado. Vive há demasiado tempo um capitalismo em que alguns capitalistas não correm riscos, justamente porque o governo de turno corre a socorrê-los à primeira dificuldade.
Em algum momento, essa UTI financeira à custa do dinheiro público terá de ser interrompida. E o momento é já, pois está em andamento um plano de estabilização cujo pilar central é exatamente o equilíbrio das contas públicas.

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