São Paulo, sábado, 6 de agosto de 1994
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Ricupero para presidente da OMC

ANTONIO OLIVEIRA SANTOS

Talvez a mais importante decisão da Rodada Uruguai tenha sido a criação da Organização Mundial de Comércio, a OMC, entidade que a partir de janeiro substituirá o Acordo Mundial de Comércio e Tarifas, o Gatt.
No acordo geral que encerrou a Rodada, foi afinal aprovada ampla redução de tarifas de importação –alcançando o até então inexpugnável Japão– e estendeu-se as normas do Gatt às transações da agricultura e serviços.
Além disso, foram assinados acordos sobre a propriedade industrial e investimentos.
Na área dos serviços, porém, ficaram para ser discutidas depois as polêmicas questões sobre a marinha mercante, telecomunicações e mão-de-obra.
Na realidade, como sempre aconteceu no Gatt, os países ricos levaram nítida vantagem na Rodada Uruguai, embora o Terceiro Mundo seja também beneficiado com a diminuição tarifária. O próprio presidente Clinton, à véspera da assinatura de acordo que encerrou a Rodada, indiscretamente revelou: "Estamos a um passo de vitória histórica dos nossos esforços para abrir os mercados estrangeiros aos produtos norte-americanos".
Não menos significativos foram os comentários do secretário do Tesouro, Lloyd Bentsen: "Serão mais e melhores empregos para os trabalhadores norte-americanos e mais mercados estrangeiros abertos a nossas mercadorias e serviços".
Por seu turno, o ministro da economia da Alemanha, Gutner Rexrodt assinalou que os industrializados serão os mais favorecidos com a liberação aprovada. A criação da OMC enseja agora à grande maioria da comunidade internacional integrada pelos países em desenvolvimento, oportunidade de começar a imprimir uma ordem mais justa para as transações comerciais, de mercadorias e serviços.
As duas posições em jogo –a sede da organização e a sua presidência– devem ser divididas. Embora a próspera cidade de Cingapura –na Ásia, onde mais cresce o comércio exterior– esteja pleiteando sediar a entidade, é razoável que ela permaneça na Europa, não em Bonn, como querem os alemães, mas em Genebra, onde herdaria as instalações e o experimentado quadro técnico do Gatt.
Não se pode admitir é que o bloco dos ricos continue detendo as duas posições e siga ditando, aliás de forma parcial, as normas do comércio mundial. Unidas as nações em desenvolvimento em torno de um só candidato, ele se tornará imbatível.
Na Ásia já surgiram alguns pretendentes, como os primeiros-ministros Arnand Panyarachum, da Tailândia, e Moeen Qureshi, do Paquistão, além do ministro das Finanças da Índia, M. Manmohan.
Na América Latina surgiu a intempestiva candidatura do presidente do México, Carlos Salinas, concorrendo com a do ministro da Fazenda do Brasil, Rubens Ricupero –este efetivamente o mais qualificado para este importante cargo.
Ricupero conhece de fato os graves e delicados problemas do comércio internacional. Foram frutíferos os quatro anos que, como representante do Brasil no Gatt, presidiu diversas comissões da Rodada Uruguai sempre atento às investidas protecionistas dos países industrializados.
Quando o Brasil e outros países em desenvolvimento foram acusados pelo Departamento de Comércio norte-americano por obstacular as exportações norte-americanas, Ricupero, então embaixador em Washington, elaborou um oportuno relatório, onde alertava para o fato de que 26% das exportações brasileiras para os EUA estavam sujeitas a sobretaxas e outras barreiras não-tarifárias, enquanto apenas 14% das exportações norte-americanas para o Brasil sofriam as mesmas restrições.
Agora, no comando da economia brasileira, Ricupero mais uma vez mostra um estilo de liderança marcado pela seriedade, ponderação, visão política e uma excepcional capacidade de reagir a pressões com sólida argumentação técnica.
E é isso que a OMC vai precisar.

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