São Paulo, segunda-feira, 8 de agosto de 1994
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O complexo de Itamar

GILBERTO DIMENSTEIN

BRASÍLIA – Raras vezes se viu um pito público tão vexaminoso de um presidente da República a seus ministros. Na prática, Itamar Franco chamou ontem de mentirosos os ministros Beni Veras, do Planejamento, e Rubens Ricupero, da Fazenda.
Arrasta-se uma árdua discussão dentro do governo sobre reajustes dos funcionários civis e militares. Preocupada com a estabilidade dos preços, a equipe econômica resiste a abrir os cofres.
Itamar disse ontem que, com ou sem apoio dos ministérios do Planejamento e Fazenda, o aumento sai esta semana. E lançou uma constrangedora frase sobre os números que são apresentados: "Os números não mentem, mas os mentirosos fabricam números".
A grosseria deve ser entendida por dois ângulos. O primeiro deles, educacional. Itamar Franco é desumanamente despreparado. Testemunhei por várias vezes como ele se perdia nos dados elementares de orçamento durante a CPI da Corrupção do governo Sarney, da qual era vice-presidente –a investigação daquela CPI era, essencialmente, centrada nos labirintos das verbas a fundo perdido.
O segundo ângulo é o psicológico. Itamar Franco é um complexado e tenta por todos os meios mostrar-se poderoso. Nem que tenha de praticar humilhações públicas. Ele ganhou de presente a Presidência da República. Chegou lá não pelos seus méritos, mas pelas falhas de Collor. Só por isso.
Ao assumir, cometeu erro atrás de erro, transformando os ministérios econômicos num motel de alta-rotatividade, enquanto a inflação subia. Em meio ao clima de desgoverno, cresceu a tese de antecipação das eleições. Ele próprio acenou por diversas vezes com a possibilidade de renúncia.
Se um Fernando ajudou-o a virar presidente, outro Fernando salvou seu mandato. Por causa do Plano Real, Itamar Franco melhorou sua imagem. Lembre-se que, durante a elaboração do plano, ele significava mais um problema do que uma solução.
Por por pouco, não abortou o lançamento da URV e se seduziu por teses como congelamento de preços, aumentos salariais e queda abrupta dos juros.
O fato é que, entre as dezenas de problemas para a estabilização de preços, um deles chama-se Itamar.

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