São Paulo, sexta-feira, 12 de agosto de 1994
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Os dilemas do PT

LUÍS NASSIF

Pouco antes de iniciar a campanha eleitoral, ouvi de dois sólidos empresários modernos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) uma afirmação até certo ponto surpreendente: "Entre Lula e Fernando Henrique ficamos com Lula, porque pelo menos ele representa uma esperança de ruptura com este modelo existente".
Ainda não se consumara a aliança de FHC com o PFL, nem havia Marco Maciel. Mas para os dois empresários, a atuação de FHC como ministro, o fato de ter colocado sua candidatura acima das reformas, era suficientemente clara para que perdessem as esperanças em relação à vontade política do candidato em articular reformas.
Preferiam correr o risco Lula acreditando que, dando certo ou errado, seu governo representaria uma ruptura do modelo político-institucional.
Não os encontrei depois disso. Mas, se provavelmente aumentou seu desânimo com a candidatura FHC depois de suas últimas alianças, é duvidoso que continuassem mantendo as esperanças de que o PT representaria a ruptura com o estabelecido.
No fundo, o PSBD é uma rocha de convicção perto das perplexidades do PT –e reside aí provavelmente a razão da queda de Lula nas pesquisas realizadas nos centros mais modernos.
Pouco tempo de campanha foi suficiente para robustecer a sensação de que, no poder, o partido acabaria imobilizado por sua própria falta de rumos. O episódio Bisol foi tristemente sintomático. Primeiro, por revelar a falta de disposição de Lula de definir pendências internas do partido. Depois, por demonstrar o inacreditável poder de grupos que dominam a Executiva, de impor seus interesses internos sobre os interesses maiores do partido.
Bisol demorou a sair, porque significaria o esvaziamento das tendências que assumiram a Executiva e passaram a instrumentalizar o partido.
No início da campanha, Lula alardeou que o único compromisso do partido era com a erradicação da pobreza e a retomada do desenvolvimento. Todo o restante –estatização, corporações públicas, capital estrangeiro– seria tratado sob esse prisma, sem o véu dos preconceitos ideológicos.
Na prática, a cada dia que passava menos claro ficava esse ideário. A visão modernizante presente na carta programa de fins do ano retrasado foi substituída pelos velhos dogmas.
Pior: quando os moderados do partido passaram a divulgar os principais pontos de seu programa econômico, ficou no ar um indisfarçável sentimento "déjà vu", o jogo dúbio de adaptar o discurso a cada platéia, desnorteando a todas.
O grande compromisso com a cidadania foi substituída pela defesa da ampliação da ação do Estado, pelo fechamento do mercado, pela defesa das "conquistas históricas" das corporações. Visões modernas, como a do prefeito de Porto Alegre, Tasso Genro, ou dos deputados José Genoíno e Paulo Delgado, compromissos com novas formas de gerenciar o Estado passaram para terceiro plano, enquanto o partido retomada a velha cantilena da crítica à ditadura militar –um fantasma que morreu há mais de dez anos e que só foi ressuscitado recentemente por obra de líderes do PT.
O partido tem muito a oferecer ao país quando conseguir superar suas dúvidas internas e decididamente colocar a recuperação da cidadania como ponto central, passando por cima dos interesses corporativistas.
Mas, a julgar pelas próprias avaliações internas do PT, parece cada vez mais tema para as próximas eleições.

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