São Paulo, segunda-feira, 15 de agosto de 1994
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Fugazi leva música independente a sério

MARCEL PLASSE
ENVIADO ESPECIAL A BELO HORIZONTE

Fugazi, que toca hoje no BH Rock Independent Fest em Belo Horizonte (MG) e sábado no Aeroanta (SP), é uma das bandas que mais leva a sério a palavra independente no rock.
Ian Mackaye, vocalista da banda, é um dos proprietários do selo Dischord, que desde 1980 tem lançado bandas alternativas.
O Dischord sobrevive praticamente das vendas por reembolso postal. Seus discos não são licenciados para nenhuma distribuidora fora dos EUA.
Mas talvez a banda feche um contrato com alguma empresa brasileira. "Isso pode acontecer se encontrarmos alguém disposto a vender os discos ao preço que achamos justo. Mas, a maioria das companhias que nos procuraram são ricas ou corruptas."
Mackaye é capaz de falar horas sobre seus pontos de vista, que podem ser resumidos na exaltação da individualidade contra a indústria e a mídia.
Ele se assusta com a palavra socialista que, diz "é muita usada nos Estados Unidos para esvaziar causas". Mas, ao mesmo tempo afirma: "para mim, a música independente é tão importante na sociedade quanto o trabalho social".
"Quando começamos, só existiam pequenas bandas punk em Washington. Nenhuma gravadora procurava essas bandas porque não havia dinheiro a ser ganho com elas. O que era perfeito. Agora, porém, há dinheiro a ser ganho. Mas, se duramos tanto tempo sendo independentes, não vai ser agora que vamos aceitar a proposta de uma grande gravadora."
A cena de Washington DC praticamente se desenvolveu em torno do Dischord. Atualmente, todas as bandas de selo são de Washington, formadas por amigos do Fugazi, que gravam discos sem sequer um contrato.
Mackaye chama atenção para o fato de que bandas que vendem 20 mil cópias de discos nos EUA são procuradas com contratos milionários. "Nós costumamos vender 200 mil, imagine o quanto nos foi oferecido."
Ser independente, para Mackaye, é um ato político. "Qualquer coisa, por mais agressiva que seja, pode ser lançada por uma grande gravadora. Para nós, o interessante é controlar o meio, a maneira como as coisas funcionam."
A banda se recusa a fazer videoclipes e procura o máximo evitar ser rotulada. "O jeito como a mídia musical se comporta é louco. É compreensível que algumas bandas se identifiquem com alguns estilos regionais, como um sotaque, mas não há nada, nada, ou na geografia de Washington ou de Seatlle que façam todas as bandas soarem iguais."
Mackaye insiste em que música é individualidade. "Nos Estados Unidos generalizar é trivializar. O grunge trivializou Seattle."
Mas, ao mesmo tempo, uma canção escrita por Mackaye em 1980 (na época em que cantava no grupo Minor Threat), chamada "Straight Edge", deu origem a um rótulo musical.
"É apenas uma música sobre ser um rapaz que não bebe e não se droga num mundo em que todos fazem isso. Obviamente, muita gente concorda com isso. E outros que nos acharam fascistas por causa disso. Houve muita reação em torno dessa música, tanto que tenho que dizer em cada entrevista que ela não representa o movimento. É apenas a minha escolha. Uma canção sobre estar bem do que jeito que sou."
Fugazi também é notório por não cobrar ingressos superiores a US$ 5 para seus shows e por estampar o preço de seus discos de maneira visível nas capas. É um preço que chega a ser a metade do que as lojas cobram por produtos equivalentes.
"Você não impede uma loja de vender algo por um preço menor. Mas pode lembrar aos compradores que eles estão sendo explorados e que existe uma alternativa, que é o reembolso postal."
Esta é a segunda vez que ele vem ao Brasil. Esteve aqui em janeiro de 93, acompanhando o grupo L7 no Hollywood Rock.
O Fugazi nunca se apresentou num show patrocinado por uma grande corporação. Mackaye descreve a experiência do Hollywood Rock como algo esquisito.
"Nenhuma das bandas (L7, Nirvana e Red Hot Chilli Pepers) sabia que Hollywood era uma marca de cigarros. Elas deviam ter se informado. Podem ter certeza que o Fugazi se informou sobre o que era o BH Rock Independent Fest."

O jornalista MARCEL PLASSE viaja a Belo Horizonte a convite da organização do festival.

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