São Paulo, domingo, 21 de agosto de 1994 |
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Carlos está pronto para o futuro, diz advogado
ANDRÉ LAHOZ
Ele é famoso também pelas polêmicas em sua carreira. Já defendeu, por exemplo, Klaus Barbie, o nazista conhecido como "o açogueiro de Lion". Recentemente, foi acusado pelo jornal "Le Monde" de ter pertencido ao grupo do Chacal como "membro operacional". O advogado contra-atacou, desmentindo a acusação e afirmando que a França planejou matá-lo no início dos anos 80. Na saída da prisão, onde esteve anteontem por mais de uma hora com seu cliente, concedeu à Folha a entrevista que se segue. Folha - Como está Carlos? Jacques Vergès - Ele está muito bem. Está com boa saúde e pronto para o futuro. Finalmente ele teve acesso a uma TV, mas ainda não tem rádio ou jornais. Folha - O que vocês conversaram? Vergès - Falamos basicamente de literatura latino-americana. Conversamos sobre um escritor venezuelano que adoro, Rómulo Gallegos. Folha - Qual é o escritor preferido de Carlos? Vergès - (risos) Não sei. Prometo que perguntarei a ele e responderei depois. Folha - Como Carlos reage à possibilidade de ter outros inquéritos abertos contra ele? Vergès - Está reagindo filosoficamente, no sentido que quer resolver sua situação por completo. Folha - Qual é o sentimento de Carlos em relação às vítimas? Vergès - Carlos é um ser humano e, como tal, fica triste pelas pessoas que morreram. Ele tem um grande sentimento por todos esses mortos. O que é preciso que se diga é que havia muita violência nessa época, de ambos os lados. Foi uma época violenta de nossa história, e as pessoas que viveram então estavam sujeitas à isso. Vou dar um exemplo: eu estive lutando contra os alemães na Segunda Guerra. Nós atirávamos contra tanques alemães, que se incendiavam. O soldado que se encontrava no interior certamente morria, e eu ficava triste com isso. Mas era a nossa luta, e foi assim que vencemos a guerra. Folha - Ou seja, para o sr. Carlos não é um criminoso, mas um combatente. Vergès - Exatamente. Se fosse um criminoso atrás de dinheiro, um mercenário, não teria saído da casa de seus pais, que eram e ainda são muito ricos. Ele lutava por um ideal, e não por recompensa financeira. Folha - O sr. fala em combate. Carlos admitiu ter matado alguém (o terrorista é acusado pela morte de 83 pessoas)? Vergès - Eu não disse isso, não disse nada referente à mortes. Por enquanto, ele está sendo acusado por apenas um crime (o da rua Marbeuf, de 1982, que matou uma pessoa). Folha - Sobre esse crime, qual será a base da defesa? Vergès - Não posso dizer nada, porque não sabemos qual a base da acusação. Ainda não temos nada de concreto. Mas posso adiantar que Carlos não se encontrava na França no momento do atentado. Folha - Sobre a forma como Carlos foi preso, o que o sr. tem a declarar? Vergès - Carlos está na França de forma absolutamente ilegal. Quando uma pessoa é presa e deve ser mandada para outro país, há um processo chamado extradição. Não foi o que ocorreu com Carlos. Tampouco foi uma expulsão, porque Carlos foi enviado exatamente para o país que o procurava. É estranho ver que os ministros da Justiça e das Relações Exteriores estão mudos, somente Pasqua (Charles Pasqua, ministro do Interior) aparece. O que houve foi um sequestro, não uma prisão. Folha - O que a defesa fará? Vergès - Já na próxima semana queremos apresentar queixa na Justiça. Vamos também apresentar nossas conclusões para que Carlos seja mandado embora da França, uma vez que se encontra ilegalmente no país. Folha - O sr. realmente acredita que a França o deixará ir embora, após caçá-lo por 20 anos? Vergès - Eu não sou mais criança e nem acredito em milagres. Sei que o nosso pedido será recusado. Apelaremos, e a Corte de Apelação recusará igualmente. E continuaremos a perder, até que a questão chegue à Corte Européia de Direitos dos Homens. Lá, o caso será julgado por pessoas de vários países, que estão mais isentos e poderão constatar que o sequestro de Carlos foi ilegal e que ele deve partir. Folha - O sr. afirmou que a França quis matá-lo. Como foi isso? Vergès - Meu nome esteve em duas listas de pessoas a serem eliminadas pela polícia secreta francesa no início dos anos 80. Uma vez, o crime foi recusado, mas após acertou-se que eu deveria ser morto fora da França. Não tenho muito mais a dizer, quem quiser saber dos detalhes deve perguntar ao chefe do Estado (referindo-se ao presidente francês, François Mitterrand). Texto Anterior: Saiba quem é Forsyth Próximo Texto: ONU discute população mundial no Cairo Índice |
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