São Paulo, quinta-feira, 25 de agosto de 1994
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Guerra antecipada

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O PT jogou a toalha. Convencidos de que não há mais chance de vitória, os integrantes da cúpula do partido buscam agora fórmulas para diminuir o papelão.
A virada de Fernando Henrique nas pesquisas provocou o surgimento de dois Lulas. Há o Lula dos comícios, para consumo da militância, e há o Lula reservado.
Este último, conhecido apenas pelos cardeais do PT, é um homem desalentado. Derrama-se em lamúrias. Busca explicações para a derrota.
A ala moderada do PT mostra-se preocupada com o futuro da legenda. Em 89, Lula deu um susto no partido. Derrotado por Collor, não quis candidatar-se a deputado.
Naquela ocasião, o candidato mergulhou em profunda depressão. Teme-se que, agora, na eventualidade de um novo insucesso, Lula acabe tomando decisões precipitadas.
Um outro drama ronda o PT. Abriu-se uma guerra nos subterrâneos da legenda. Radicais e moderados responsabilizam-se mutuamente pelo fracasso da campanha.
Graças à habilidade de Lula, as alas "heavy metal" e "light" do PT vinham se suportando.
O grande receio da direção petista é o de que Lula, abatido como está, não consiga ou não queira mais administrar os conflitos de sua legenda.
O PT havia boicotado a revisão constitucional justamente para evitar a precipitação de uma guerra interna. Avaliou-se que o conflito enterraria as pretensões presidenciais de Lula.
Os grupos voltaram a entrar em choque na fase de elaboração do programa do PT. Novamente Lula entrou em campo.
Em reuniões sigilosas com os radicais, pediu-lhes que, em nome de objetivos maiores, mantivessem a calma.
A duras penas, arrancou do texto do programa, à última hora, propostas como a defesa da suspensão do pagamento da dívida externa.
Mal ou bem, Lula vinha conseguindo equilibrar-se entre uma e outra tendência.
Mas a simples perspectiva de derrota começa a opor uns aos outros. Está aberta no PT a temporada de caça aos responsáveis pelo fracasso.
Moderados culpam radicais e vice-versa. O jogo de empurra é o prenúncio de uma batalha pela hegemonia interna no PT. O sucesso costuma curar feridas. O fracasso as expõe de forma implacável.
Ao contrário da vitória, que tem paternidade múltipla, a derrota é, normalmente, órfã. O PT não esperou pela abertura das urnas. Busca antecipadamente o pai do seu infortúnio.

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