São Paulo, quinta-feira, 25 de agosto de 1994
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Novo 'Anel' faz apoteose da moda

LUÍS ANTÔNIO GIRON
DO ENVIADO ESPECIAL A BAYREUTH

Vaias e sapateados passionais sacudiram o teatro de madeira de Wagner na última segunda, no início do último ciclo do "Anel dos Nibelungos" da temporada. Iniciou com "O Ouro do Reno" e termina neste sábado com "O Crepúsculo dos Deuses". Anteontem, foi a vez de "A Valquíria", que teve recepção idêntica à récita da noite anterior. O encerramento será domingo, com "Tristão e Isolda".
A montagem do "Anel", encenada pelo diretor alemão Alfred Kirchner e regida pelo maestro norte-americano James Levine, tem sido o assunto preferido entre os "romeiros"' que apinham Bayreuth. Pelo jeito, continuará sendo nos próximos quatro anos. Cinco anos é o tempo regulamentar para uma montagem no Festspielhaus.
Houve aplausos além das vaias. Mas foram protocolares. O fato se repetiu ao longo do mês. Levine recebeu ovações, enquanto que Kirchner, vaia e mais vaia.
O resultado final da representação, porém, não é responsabilidade de Levine, mas de Kirchner e da costureira Rosalie, também responsável pela cenografia.
A dupla criou uma verdadeira apoteose "fashion" no palco. A ação foi estereotipada em nome do desfile de modelitos extravagantes. Uma representação mundana só comparável àqueles desfiles modernos de São Paulo.
O figurino de Wotan lembra o desenho animado "Thor – O Homem-Trovão". As três filhas do Reno aparecem fazendo acrobacias trajando uniformes colantes de aeróbica. Nunca se viu em Bayreuth filhas do Reno tão pneumáticas. O anão libertino Mime (o barítono Manfred Jung) teve finalmente motivo para se refestelar.
Para os encenadores, modernidade é isso: introduzir elementos contemporâneos superficiais, respeitar a partitura e não aceitar os desafios da dramaturgia wagneriana.
O problema vai continuar. Como representar Wagner sem trai-lo? Curiosamente, Bayreuth é hoje o derradeiro território da música evolutiva, aquela que professa crença no desenvolvimentismo. Ainda se acredita aqui na atualização de Wagner, porque ainda se acredita em Wagner, de alguma forma. Ora, esta crença também está chegando ao termo. Virá brevemente o dia em que Wagner será montado como no século 19, em nome da fidelidade histórica. Nesse futuro, Rosalie e Kirchner deixarão nostalgia.

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