São Paulo, quarta-feira, 7 de setembro de 1994
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A cumplicidade de Itamar

JOSIAS DE SOUZA
DIRETOR-EXECUTIVO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Itamar Franco repetiu ao presidente da CUT: "Não permitirei a utilização da máquina administrativa na eleição." Disse que está com Fernando Henrique apenas como cidadão, não como presidente.
Ele pediu a Vicentinho que o avisasse sempre que soubesse de algo suspeito. Prometeu ser rigoroso com eventuais infratores. Insinuou que demitiria quem passasse por cima de sua ordem.
Ou o presidente é cego, ou está jogando conversa fora. Como o presidente, o ministro das Minas e Energia, Alexis Stepanenko, declarou-se aliado de Fernando Henrique. Chegou mesmo a visitar o comitê do candidato oficial.
Em seguida, passou à ação. Não como mero cidadão, mas como ministro de Estado, dono de um gordo cofre na Esplanada dos Ministérios.
Em sucessivos bilhetes remetidos a seus auxiliares, Stepanenko pediu que o cotidiano de sua pasta fosse ajustado ao calendário eleitoral.
Três de seus papeluchos encorpam um processo em fase de análise no Tribunal Superior Eleitoral. São provas inquestionáveis.
Descobre-se agora que a fúria cívica de Stepanenko está registrada também em ofício remetido ao próprio Itamar. O ministro sugere ao chefe que compareça à inauguração de uma obra em Sergipe.
Stepanenko enganchou no final do penúltimo parágrafo do texto um escandaloso adendo: "Além disso, pode ser um evento para reforçar a candidatura de Fernando Henrique no Estado e na região."
Há mais: "(...) consultamos vossa excelência e o ex-ministro Fernando Henrique, nosso candidato, da viabilidade e oportunidade de contarmos com a presença de ambos."
Um petista decidido a sabotar Stepanenko não redigiria texto tão comprometedor. Não fosse pela confirmação oficial, seria difícil acreditar na autenticidade do documento.
A carta de Stepanenko engrossa desde ontem o inquérito contra o ministro no TSE. Trata-se de outra evidência irrefutável.
Itamar não precisa da ajuda de Vicentinho. Tem diante de si um portentoso exemplo de desvio de conduta. Aliás, já poderia ter agido. Seu silêncio soa a cumplicidade.
O TSE corre o risco de desmoralizar-se se, a exemplo de Itamar, continuar calado. Há no Tribunal uma tendência à punição de Stepanenko.
A esta altura, até o PSDB torce por sua punição. Caso vença as eleições, numa hipótese remota, Lula deve pensar em premiar Stepanenko com um ministério. Ele merece.

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