São Paulo, quarta-feira, 7 de setembro de 1994
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Cripta de d. Pedro vira banheiro

VICTOR AGOSTINHO
DA REPORTAGEM LOCAL

Cerca de 50 sem-teto que vivem no Monumento do Ipiranga, na zona sul de São Paulo, usam a cripta onde estão os restos mortais de d. Pedro 1º e suas mulheres, as imperatrizes Leopoldina e Amélia, como banheiro.
Urina, fezes e até uma escada de pintor são encontrados na entrada do mausoléu do imperador.
Um rap criado por dois jovens que frequentam o local ajuda a entender a situação do monumento: "Dinheiro os políticos têm/ todos os anos eles vêm/ fazer campanha também/ e o túmulo é um fedor/ como o banheiro da Febem".
MC Angel (Cleber Félix, 17) e MC Bolão (Alexandre Ferreira, 18), autores da música que protesta contra o má conservação do monumento, reclamam que a prefeitura só lava a cripta do imperador às vesperas das comemorações pela Independência.
Hoje, Dia da Independência, estão sendo esperadas 15 mil pessoas no monumento. Em 93, visitaram o local 320 mil pessoas.
Como de praxe, a Administração Regional do Ipiranga lavou as escadarias anteontem e prometia nova lavagem hoje de manhã. Apesar da limpeza da véspera, ontem o monumento estava com forte cheiro de urina.
"Eu queria olhar lá dentro, professora", disse um dos 65 alunos da escola municipal Amélia Kerr Nogueira, que estava visitando ontem o monumento.
"Olhar o quê? Você quer ver fezes? Nada disso", respondeu a professora Lucimar da Silveira, 29, enquanto dissuadia alunos que planejavam descer as escadas.
O presidente do Condephaat (órgão estadual que cuida do patrimônio histórico), José Carlos Ribeiro de Almeida, em carta enviada ao prefeito Paulo Maluf, classificou a situação como "um espetáculo revoltante de imundice inominável".
Para manter limpo o local, Almeida sugeriu ao prefeito que colocasse guarda 24 horas por dia, "feita pelos Dragões da Independência".
O diretor da Divisão de Patrimônio Histórico (DPH) da prefeitura, Marcos Faerman, afirmou que "existe um sentimento de tristeza muito grande no DPH diante da impotência em resolver os problemas do monumento".
Segundo Faerman, a manutenção do monumento é de responsabilidade da União, Estado e município. "Isso dilui a responsabilidade", lamentou.
Nina Lomônaco, diretora de museus da prefeitura, explicou que o município tem um projeto de recuperação do monumento orçado em R$ 2 milhões. De acordo com ela, na próxima semana começam as discussões sobre a reforma.
"Mas qualquer recuperação terá sido em vão se não colocarmos banheiros no monumento", disse Lomônaco.
O diretor do DPH informou ontem que hoje cedo seriam colocados tapumes para que os visitantes não desçam as escadarias da cripta.
"Não sei de tapume nenhum. Ainda não fui comunicado", disse ontem, às 18h30, o administrador regional do Ipiranga, Domingos Dissei.
Dissei afirmou que a "administração lava o monumento todos os dias". "Venho aqui direto e posso jurar que eles só lavam muito de vez em quando", assegurou o rapper MC Angel.
Para José Sebastião Witter, diretor do Museu Paulista –que pertence à USP e está instalado no Parque da Independência–, a solução definitiva para o fim dos dejetos na cripta do imperador seria o policiamento, a limpeza e a construção de banheiros no parque.
O Museu Paulista também não tem banheiros públicos.

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