São Paulo, terça-feira, 13 de setembro de 1994
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Governo do Estado de SP cuida de seus museus

RICARDO OHTAKE
ESPECIAL PARA A FOLHA

No dia 28 de dezembro de 1895, o italiano Ângelo Piza, de 27 anos, casado com Maria, de 23, chegou ao porto de Santos à bordo do navio Edílio Raggio. Essa informação –será que se refere aos mesmos Piza de Daniel Piza, jornalista que se mostrou tão desinformado na reportagem sobre os museus, publicada na Folha a 5 de setembro?– sim, a informação só foi obtida porque os museus de São Paulo vêm investindo na organização e complementação de seus acervos.
Daniel Piza talvez não saiba o que significa resgatar a memória familiar dos milhões de descendentes de imigrantes. Pois na série "Cultura em Crise", publicada pela Ilustrada, a importância de toda a política museológica do Estado de São Paulo é menosprezada e distorcida.
Desde abril de 1993, o Estado de São Paulo está implantando um sistema de museus baseado em alguns pontos fundamentais, incluindo a revitalização dos museus do interior cujos acervos têm interesse estadual ou nacional; a municipalização de 44 unidades; a catalogação e complementação de coleções; a adequação de espaços para exposições e a criação de dois novos museus de grande porte: o Museu da Imigração e o Museu da Ciência e da Indústria.
Na capital, a rede inclui a Casa das Rosas, o Museu de Arte Sacra, o Museu da Casa Brasileira, o Museu da Imagem e do Som e a Pinacoteca do Estado. Esses museus, pelo contrário, vêm sendo vivificados. A Pinacoteca, por exemplo, passa por uma restauração no segundo pavimento, danificado por uma ocupação mercenária.
A reforma da Pinacoteca foi elogiada pelo arquiteto catalão Josep Botey, restaurador das obras de Gaudi, em Barcelona, em sua recente visita ao país. A obra permitirá a exposição, pela primeira vez de forma permanente, do seu acervo formado por aproximadamente 4 mil obras de arte.
Na reportagem em questão, Daniel Piza diz que "acervo é uma palavra que parece ter caído de moda na museologia pública paulista". Uma análise menos superficial mostra que não é assim. O fato é que o próprio conceito de acervo é hoje discutido, levando-se em conta o perfil de cada unidade, a multiplicidade de linguagens e os diferentes recursos acessíveis à organização de um museu. Questões que o jornalista parece desconhecer.
Pois vejamos: se falarmos dos acervos no sentido tradicional, este ano foram destinados cerca de US$ 200 mil à Pinacoteca para a aquisição de obras que devem complementar sua coleção do século 19, como bem afirma a reportagem. Assim como destinou-se verba para as coleções de fotos que foram compradas pelo MIS e não doadas.
Se, por outro lado, falarmos de um acervo virtual, devemos mencionar a nova fase do Museu da Casa Brasileira, no qual está sendo montado o primeiro banco de dados digitalizado da arquitetura brasileira, inédito no país.
Com relação aos museus que estão sendo criados, consideramos significativo o acervo de oito mil peças (e não 900) do Museu da Imigração, além dos quatro milhões de nomes que estamos recuperando nos arquivos públicos da Hospedaria do Imigrante, Secretaria da Justiça, Arquivo do Estado e Secretaria da Agricultura; assim como a produção de peças nas indústrias e universidades para o Museu da Ciência e da Indústria. Os museus não estão concluídos e sabemos que o avanço se dá gestão após gestão.
As informações aqui arroladas devem ser suficientes para mostrar que o governo de São Paulo está cuidando dos seus museus, recompondo, atualizando e complementando acervos, criando reservas técnicas, adequando laboratórios e prédios e melhorando as condições de pesquisa.
Como exemplo dessa preocupação, a Secretaria de Estado da Cultura promove o primeiro "Encontro Entre Museus", nos dias 24 e 25 de outubro, conforme mencionado na reportagem. Mas não para "discutir a crise dos museus", mas para incitar uma discussão permanente sobre questões técnicas, política de acervo e programação, entre outras. Uma das propostas que queremos encaminhar nesse encontro é a criação de uma associação de museus.
Ao analisar a situação cultural do país na série "Cultura em Crise", nada se informa sobre os museus alheios à nossa rede.
O trabalho que estamos realizando neste breve ano e meio de gestão não resolve, efetivamente, uma questão tão complexa como a dos museus. Mas museu não é uma equação a ser resolvida. Museu é um patrimônio em constante processo e reinvenção.

Resposta do jornalista Daniel Piza - Se o banheiro de sua casa está com infiltrações, você não vai comprar um bar novo para a sala. Banal. Mas é justamente isso o que o governo do Estado está fazendo: gastando quase US$ 6 milhões no Museu da Imigração, enquanto os museus existentes acumulam precariedades. E esse conceito de "acervo virtual" é mais do que contestável. Museu é "patrimônio em constante processo e reinvenção", diz o secretário. Ocorre que: a) não há como reinventar goteiras; e b) o processo básico de um museu é a aquisição, pesquisa e exibição de seu acervo, três fatores em que os museus estaduais são inegavelmente deficientes.

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