São Paulo, sexta-feira, 13 de janeiro de 1995
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Mostra resgata cinema de Sacha Guitry

CÁSSIO STERLING GOMES
DA REDAÇÃO

Mostra: Sacha Guitry
Onde: Sala Cinemateca
Quando: de amanhã até dia 23

Em um mês ainda frio de atrações, começa amanhã na Sala Cinemateca uma retrospectiva com 12 filmes feitos entre 1936 e 1957 por Sacha Guitry (1885-1957), um dos mais importantes e menos conhecidos cineastas franceses.
Ator e dramaturgo, Guitry foi um dos responsáveis pela glória do cinema francês nos anos 30.
Na década em que os filmes foram sendo gradualmente dominados pela magia da fala, Guitry construiu sua fama de mestre do diálogo. Seduzido pelas possibilidades do advento do cinema sonoro, seus filmes, frequentemente acusados de "teatro filmado", inauguraram uma modernidade radicalizada nos anos 60 pela geração da Nouvelle Vague.
O questionamento da natureza híbrida do cinema com sua conjugação instável de sons e imagens está nos filmes de Guitry bem antes daqueles que um diretor como Jean-Luc Godard realiza até hoje.
Entre os 12 filmes da mostra, pelo menos três são obrigatórios. Na ordem cronológica, "O Romance do Trapaceiro" é um de seus trabalhos mais cultuados. Esta fábula sobre um menino que, por ter cometido um furto nas economias da família, é posto de castigo e impedido de jantar, já encerra todas as ambiguidades morais dos filmes de Guitry.
Os cogumelos colhidos para a refeição envenenam toda a família e o garoto é poupado justamente porque cometeu uma falta. Daí por diante o destino acumula para ele o mesmo sentido de risco e compensação dos jogos de azar.
Este mesmo tipo de lógica que se confunde com a insanidade domina "O Veneno". Protagonizado pelo inesquecível Michel Simon –célebre ator de "Boudu Salvo das Águas", de Renoir, e de "Atalante", de Jean Vigo–, "O Veneno" é um drama criminal repleto de ambiguidades.
Simon faz um senhor atormentado pela mulher e que decide eliminá-la. Consulta um advogado para descobrir quais circunstâncias serviriam de atenuantes no caso de uma morte acidental. Com a posse de todas as condições para o álibi, parte para a efetivação do crime.
O exame das relações entre som e imagem tem aqui um de seus pontos altos na obra de Guitry. Durante uma refeição, o casal destila seu veneno através de olhares. Simultaneanente os dois escutam uma novela de rádio que concretiza sonoramente as idéias malignas de cada um. O significado aqui é obtido por meio de uma solução que ultrapassa o impasse da representação do pensamento de um personagem no cinema.
Uma curiosidade que pode surpreender é "Os de Casa". Iniciado em 1914, mas só concluído em 1952, "Os de Casa" é uma espécie de filme amador que pretende responder um manifesto publicado por intelectuais alemães que exaltavam a cultura de seu país.
Para tanto Guitry faz desfilar um "elenco" que se poderia chamar de estelar. Sarah Bernhardt, Edgar Degas, Auguste Rodin, Camille Saint-Sa‰ns, Edmond Rostand, Claude Monet e Octave Mirbeau protagonizam este culto a uma nobreza extinta.
(Cássio Starling Carlos)

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