São Paulo, quarta-feira, 18 de janeiro de 1995
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Almas atormentadas vagam por 'Exótica'

MAURICIO STYCER
DA REPORTAGEM LOCAL

Ao exibir "Exótica" no último Festival de Cannes, o canadense de origem armênia Atom Egoyan foi apresentado ao público como "o jovem David Lynch".
Não se sabe até que ponto a comparação ajudou, mas Egoyan saiu de lá com um prêmio de prestígio, o da crítica internacional, e a possibilidade de exibição do filme fora do circuito de cinemas de arte, a que parecia destinado.
O cineasta não gosta muito de ser comparado a Lynch, mas alguns dos ingredientes de "Exótica" remetem imediatamente à habilidade que o norte-americano exibe em produzir filmes com cacoete de "cults", como "Veludo Azul" e "Coração Selvagem".
Em "Exótica", o principal cenário é um clube de striptease, inteiramente construído em estúdio, chamado Exótica, no qual os clientes podem convidar as stripers a se exibirem em suas mesas, mas são proibidos de tocá-las.
É nesse mundo literalmente artificial, ao som de Leonard Cohen, que as almas atormentadas de Egoyan vão exibir suas dores.
Francis, um fiscal de rendas abalado pela morte da filha, se apaixona por Christina, uma dançarina que faz seu show de striptease fantasiada de colegial.
Christina é vigiada de perto pelo ex-namorado Eric, que vem a ser o disc-jóquei do "Exótica".
Eric foi contratado pela dona do clube, Zoe, para engravidá-la e não decepcionou na função.
Thomas é um contrabandista de animais exóticos investigado por Francis. Homossexual tímido, caça parceiros em espetáculos de música clássica e balés.
Tracey é uma pianista que trabalha como babá da filha (morta) de Francis enquanto ele assiste os shows de striptease.
Em seu conjunto, esse elenco de solitários e desesperados transmite o que há de mais forte no filme de Atom Egoyan.
Esse pessimismo, que percorre "Exótica" do início ao fim, é reforçado por um roteiro bem construído, escrito pelo próprio cineasta (ele também acumula a função de produtor da obra).
Em "Exótica", a história de um personagem é (quase) sempre esclarecida por algum outro, em uma cena que ainda vai acontecer.
É um método de criação que, para cérebros viciados em roteiros hollywoodianos, pode ser uma barreira intransponível.
Em compensação, os diálogos escritos por Egoyan tropeçam em clichês e são, involuntariamente, cômicos.
"Você já pensou alguma vez que não pediu para nascer", pergunta Francis a Tracey. "Já", ela diz. "Então, quem pediu?", ele volta a perguntar, seriíssimo. Falta a "Exótica" saber rir de si mesmo para ser um autêntico cult.

Vídeo: Exótica (Canadá, 1994)
Diretor: Atom Egoyan
Elenco: Bruce Greenwood (Francis), Mia Kirshner (Christina), Elias Koteas (Eric), Don McKellar (Thomas) e Arsinée Khanjian (Zoe)
Distribuição: Alpha Filmes (tel. 011/230-0200)

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