São Paulo, segunda-feira, 23 de janeiro de 1995
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Pretinha pede reconhecimento

DA REPORTAGEM LOCAL

Pretinha já foi Pelezinha, Nêga e Terezinha. A número 7 da seleção feminina do Brasil teve uma série de apelidos entre seu nome de cartório, Delma Gonçalves, e seu atual codinome.
Torcedora do Flamengo, moradora do bairro de Senador Camará, subúrbio do Rio de Janeiro, Pretinha é a caçula da equipe.
Tem 19 anos em uma equipe com média de idade de 27 anos –que deve ser renovada em 96.
A pouca idade não quer dizer falta de experiência. Ela disputou a primeira Copa do Mundo feminina, em 1991, na China, quando tinha 16 anos.
No Sul-Americano, ela fez 6 dos 44 gols do Brasil. Agora, espera reconhecimento.
A seguir, os principais trechos de entrevista concedida por Pretinha à Folha, por telefone.

Folha - O sucesso da seleção feminina no Sul-Americano vai dar uma guinada na modalidade e na profissionalização das jogadoras?
Pretinha - Por enquanto, eu não vi nenhuma mudança na minha carreira. Mas tenho esperança que o futebol feminino ganhe espaço e as jogadoras sejam reconhecidas, com melhores salários para as atletas e infra-estrutura para o futebol feminino.
Folha - Como é sua vida como profissional de futebol em seu clube, o Vasco?
Pretinha - Treino todas às noites umas quatro horas, das 19h às 23h. Para ir ao campo de treinamento do Vasco tenho que tomar dois ônibus.
Demoro uma hora para chegar lá. Chego em casa quase meia-noite. Minha mãe sempre fica me esperando no portão.
Folha - Alguma jogadora do Vasco tem carro?
Pretinha - Ninguém tem. A gente até se encontra no centro do Rio para pegar o ônibus 401 para ir ao campo de treino do Bradesco, que fica no bairro da Tijuca. Das jogadoras da seleção, Russa (meia), Marisa (lateral) e Fia (meia) vão comigo no ônibus toda noite. Todas moram na zona Norte do Rio.
Folha - O Vasco da Gama, atual campeão brasileiro, não tem mais uma equipe de campo. Você já tem um novo time?
Pretinha - Continuo no Vasco. Já que o time de campo acabou, eu vou jogar futebol de salão no clube.
Folha - Como é ser a jogadora mais jovem de uma seleção?
Pretinha - Sou, às vezes, tratada como criança. Muitas jogadoras me dão conselhos.
Folha - Alguma, em especial, conversa mais com você?
Pretinha - A Fanta (lateral-esquerda de 28 anos) é como uma mãe para mim. Ela me chama de filha e sempre conversa comigo e pede para que eu me dedique mais.
Sempre que eu fico duvidando se continuo minha carreira, ela me aconselha a seguir.
Folha - Você já pensou em abandonar o futebol?
Pretinha - No começo pensei que minha família não ia gostar da idéia, mas ela me apoiou. Mas, graças à minha família e às outras jogadoras, eu sigo jogando.
Folha - Você tem algum outro apelido no grupo?
Pretinha - Elas me chamam de dengosa e chorosa, porque eu sempre falo baixo. É o meu jeito.
Folha - Como começou a jogar futebol?
Pretinha - Aos 7 anos, brincava na rua. Em 1991, comecei a jogar no Mendanha, de Campo Grande (RJ). Nesse ano larguei a escola e fui para o Mundial da China. Parei de estudar na sexta série.
Folha - Você não pensa em voltar a estudar?
Pretinha - Acho difícil voltar agora.
Folha - Alguém mais em sua família joga futebol?
Pretinha - Tenho duas irmãs e dois irmãos, todos maiores. Só um irmão meu jogou futebol, em um time da terceira divisão do Rio. É capaz que ele volte este ano a disputar o mesmo campeonato.
Folha - Como se comportaram as zagueiras adversárias no Sul-Americano?
Pretinha - Só as chilenas foram violentas. Elas puxavam a camiseta, empurravam, cometiam muitas faltas. O jeito foi tomar distância delas e me deslocar por todo o campo para evitar o contato.
Folha - Houve muita diferença técnica entre as seleções?
Pretinha - Nossa equipe foi muito superior às outras. As seleções do Chile e Argentina jogaram bem, mas precisam melhorar um pouco.
Folha - Você espera encontrar seleções bem mais fortes no Mundial da Suécia?
Pretinha - Vamos pegar times no mesmo nível que o nosso. Não espero que sejam violentas, mas farão uma marcação mais dura.
Infelizmente, na outra Copa, eu fiquei na reserva e só entrei poucos minutos.
Folha - Você tem alguma atividade fora a esportiva?
Pretinha - Não tenho. O tempo que tenho livre ajudo minha mãe em casa.
Folha - Você costuma sair à noite? Gosta de baile funk?
Pretinha - Não gosto de funk. Prefiro música baiana e pagode.
Folha - Seu namorado estranha que você seja jogadora de futebol?
Pretinha - Não tenho namorado. Mas já tive namorados e nenhum reclamou. Eles eram do bairro e sempre jogam bola comigo.
Folha - O que você vai fazer até a reapresentação da seleção, em março, para o começo da preparação para o Mundial?
Pretinha - Vou ficar em casa e seguir as recomendações do preparador físico Ricardo Rosa Pereira. Ele passou uma série de exercícios diários para todas as jogadoras manterem a forma durante as férias.

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