São Paulo, segunda-feira, 23 de janeiro de 1995
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'Jornal Nacional' precisa se reinventar

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA

A Globo faz 30 anos e o "Jornal Nacional" não muda. O esgotamento da fórmula está estampado na figura sem expressão de homem de plástico de Cid Moreira.
O "Jornal Nacional" ajudou a revolucionar o jornalismo e a TV brasileira. Apostando no aprimoramento técnico, introduziu convenções formais que ditaram as normas do telejornalismo durante décadas. Mas, preso a essa estrutura, o jornal das oito da mais importante rede de TV do país corre o risco de ficar para trás frente às inovações conceituais introduzidas pelas redes concorrentes.
Criado em 1969, o "Jornal Nacional" foi o primeiro programa a ir ao ar em rede nacional. Apostou no jornalismo "isento". Consolidou um formato fixo com a cobertura da política nacional, uma pitada de internacional, esportes e alguma variedade. Apostou na agilidade e na rapidez da notícia curta. Com esse projeto de jornalismo "clean", o jornal se impôs como um dos programas de maior audiência de nossa televisão. E se tornou referência nacional.
A vinheta expressa o projeto de maneira exemplar. O logotipo do jornal é expelido de um globo em movimento no espaço. O globo se afasta em direção à profundidade da tela, enquanto o jornal se aproxima em direção à superfície. Ele nos trás as notícias frescas, geradas pela própria realidade do mundo –sem mediações editoriais. É como se limitasse a ser uma janela para um mundo auto-evidente.
Com o tempo e a censura, nem a modernidade do projeto, com todos seus recursos técnicos, foi capaz de disfarçar o tom oficial do jornal. A legitimidade do programa foi tropeçando nas conhecidas demonstrações de parcialidade e má-fé durante a redemocratização.
O Brasil que se integrou com o "Jornal Nacional" escapou às câmeras do criador. Embora nenhum outro telejornal se atreva a concorrer no mesmo horário, muitos oferecem alternativas enriquecedoras e mais flexíveis.
O formato mais longo do "Jornal da Manchete" produz uma atmosfera calma que contrasta com a ansiedade da sequência indiscriminada de notícias-vinhetas do "Jornal Nacional". Até mesmo os índices econômicos se transformaram em vinhetas.
O comentário editorial e independente cobertura internacional do "TJ Brasil" salientam o empobrecimento das idéias que a rigidez da estrutura e uma certa obsessão pela rapidez acabou por produzir no "Jornal Nacional". Para não falar das dinâmicas entrevistas ao vivo realizadas via satélite, pelos concorrentes.
A Globo ainda é superior em recursos. Dando continuidade à extensa cobertura dada aos imigrantes brasileiros no Japão, o "Jornal Nacional" foi o único a enviar correspondente a Kobe.
A reportagem de Pedro Bial na edição da última sexta-feira mostrou a busca da embaixada brasileira aos sobreviventes do terremoto. Andando junto com a câmera e o representante consular pelas ruas destroçadas, olhando de lado com expressividade, o repórter produziu uma reportagem sensível e sem apelação. É dessa sutileza de invenção que o "Jornal Nacional" precisa para modificar a sua fórmula e ter o que dizer sobre um país de "dekasseguis", Oloduns e Acaris.

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