São Paulo, domingo, 29 de janeiro de 1995
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Jagger não derrete nem com temporal

LUÍS ANTÔNIO GIRON
DA REPORTAGEM LOCAL

A primeira noite dos Stones no Pacaembu foi magna. Ao contrário do que temia o produtor Jake Berry na última quinta, nem o temporal que caiu durante seis horas pôde estragar o espetáculo. Foi um megashow feito pelos inventores do gênero. O público se danou, se enxarcou e vibrou.
Nunca tinha visto nada assim. O grupo lançou espetáculos de grande porte e tecnologia de ponta no fim dos anos 70. Com "Voodoo Lounge", ele se coloca mais uma vez à frente. Mostrou que bons músicos não se deixam miniaturizar por maior que seja o palco e a definição do telão. Que diferença da megachatice de Michael Jackson e do trenzinho de Madonna!
A monumentalidade não se deve só ao Jumbotron e ao palco. O som original do grupo é amplificado pelos oito músicos de apoio. São doze disfarçados de quatro. Isso deve ter chocado os fãs mais fundamentalistas. Mas são contingências do aumento da surdez das massas. Ela necessita de fogos e cantores de artifício.
Nem Madame Toussaud pensaria numa réplica de Jagger tão perfeita como a que Jagger fez de si mesmo. Provou que gosta mesmo de se molhar e não derrete com chuva. Durante 2 horas e 14 minutos, dançou como um tinhoso e cantou 23 das 25 músicas do repertório com voz mais grave do que a normal, sem esmorecer.
Seu rebolado vai de encontro ao fato de ele ter 51 anos e ser avô. O Jagger de "Voodoo Lounge" parece uma construção intelectual do ancião Jagger. Este descobre o elixir da juventude no esforço muscular e no artefato.
Ele encerra a idéia básica dos Stones, ajudado pelos riffs de Richards. O resto da banda faz o papel de fundo. Importa a tonelagem de clássicos de Jagger & Richards.
Jagger iniciou com "Not Fade Away", hit de Buddy Holly, em compasso rápido. Fez uma pausa e falou em português: "Boa noite, São Paulo! Tudo bem?" Atacou de "You Got Me Rocking", do novo disco. Sempre assenhoreado do palco, cantou "Rock in a Hard Place" e "Rocks Off".
Eram 23h42 quando ele interpretou "(I Can Get No) Satisfaction". A multidão saudou-o com o grito de guerra dos rappers: "Ujererê! Ujererê!"
O show cresceu. "Angie", "Midnight Rumbler", em versão alongada, e as novas "Love Is Strong" e "I Go Wild". Apresentou a banda em português claro, às 0h30: "Nos vocais, a gatíssima Lisa Fischer. Na bateria, o superelegante Charlie Watts."
O ápice se deu com "Honky Tonk Women" e sua colagem de vídeos pornôs e imagens oficiais, e "Sympathy for the Devil". Ali, Jagger se superou no balé de trejeitos. A versão da música é maquiada de efeitos e não se compara à original, de 1968. Mesmo assim, não há coisa melhor sendo produzida no rock atual.
O show terminou à 1h28 com o bis de "Jumpin' Jack Flash". Jagger estava entusiasmado com a recepção do público. Pena que nem todo mundo tenha um helicóptero para apreciar o show completo. Enquanto estouravam os fogos, a banda fugia de carro. Pode ir. Valeram 30 anos de espera.

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