São Paulo, domingo, 29 de janeiro de 1995
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Fundos e democracia social

LUÍS NASSIF

Há duas considerações sobre o sistema de fundos de pensão. A primeira é que trata-se de modelo essencial na nova etapa do capitalismo brasileiro –e na nova rodada de privatizações. É instrumento potente de acumulação de poupança, de democratização de capital e perna fundamental no novo modelo de seguridade social –como complementação de aposentadoria.
A segunda é que –dada sua importância– o modelo exige aprimoramentos, para cumprir adequadamente sua missão.
Nos últimos anos houve avanços significativos. A compra do controle da Acesita e o sistema de gestão lá implantado –profissionalizando a diretoria e deixando de lado qualquer veleidade de politizar sua gestão– demonstraram sua maturidade como investidores institucionais.
Mas há muitos pontos a se avançar. Alguns tópicos referem-se especificamente aos fundos. Outros são mais pertinentes às relações entre União e estatais.
Uma providência relevante será disciplinar as contribuições em empresas públicas. Se não quiser se desrespeitar direito adquirido, permita-se incorporação da contribuição ao salário (recalculada para não incidir sobre o 13º) e transfira-se ao trabalhador a responsabilidade pelo pagamento da contribuição. Com isso, eliminam-se os subterfúgios e permite-se uma visão mais transparente da estrutura de salários das estatais.

Aprimoramentos
Para que o controle sobre os fundos faça-se de maneira mais eficiente, há a necessidade de se implementar os seguintes aprimoramentos:
1) Elaboração de relatórios e balanços objetivos e transparentes sobre o desempenho dos fundos
Missão facilitada pela estabilidade da moeda.
2) Novas maneiras de avaliar os investimentos imobiliários
Não há forma de saber o valor de um imóvel, a não ser quando é colocado à venda. Como saber, então, se a contabilidade dos fundos reflete de fato o valor real de suas aplicações imobiliárias? A melhor maneira de resolver esta questão é restringir estas aplicações a fundos imobiliários –que convertem sua carteira de aplicações em cotas com liquidez e valor diários.
3) Definição do sistema de capitalização individual nos fundos
Pelo sistema atual, o empregado tem direito a benefício definido, independentemente do desempenho do fundo. É um modelo que não estimula a fiscalização do empregado sobre o fundo, já que, seja qual for o desastre cometido, o benefício está assegurado. Se a aposentadoria de cada funcionário depender da situação de sua reserva matemática, haverá um interesse expresso em fiscalizar seu fundo.
4) Entregar a administração de carteiras a instituições financeiras
Uma das grandes distorções atuais em fundos de estatais decorre do fato de se entregar sua gestão a funcionários de carreira, sem experiência de mercado financeiro. Grande parte dos golpes com fundos no período PC-Zélia decorreu dessa estrutura. O modelo ideal é entregar as carteiras a instituições profissionais, obrigadas a divulgar diariamente o valor de suas cotas e a posição de suas carteiras. E fiscalizadas pelo Banco Central, pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e pelos administradores dos fundos.
5) Permitir a portabilidade das cotas
Na maior parte dos casos atuais, cada funcionário está amarrado ao fundo de pensão de sua empresa. É desestimulado a buscar empregos melhores, para não perder seus benefícios. E não tem como se defender, se julgar que seu fundo está mal gerido. A solução é permitir a portabilidade –ou seja, o direito do trabalhador levar suas cotas para o fundo que quiser, independentemente de sua situação funcional.
Com essas providências, facilitando a abertura de novos fundos, o modelo permitirá que os fundos se convertam na porta de entrada do Brasil na era do moderno capitalismo social.

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