São Paulo, quarta-feira, 4 de outubro de 1995
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FHC ataca trabalho e prostituição infantis

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente Fernando Henrique Cardoso disse ontem, no programa de rádio ``Palavra do Presidente", que uma campanha do governo, a ser lançada no dia 12, vai estimular a população a denunciar casos de prostituição infantil.
Leia a seguir a íntegra da fala de FHC no programa de ontem:

O que eu vou falar hoje me entristece, me deixa indignado e até revoltado. Eu vou falar de uma dura realidade, que afeta a vida de milhões de brasileiros: a prostituição infantil e o trabalho infantil.
Nós não podemos mais fechar os olhos. Precisamos enfrentar esses problemas com coragem e determinação. E eu digo "precisamos, porque essa não é uma tarefa só do governo. Veja só por quê: hoje, quase 3 milhões de crianças, na faixa dos 10 aos 14 anos, são pequenos trabalhadores, segundo o IBGE.
Isso é um crime! A nossa Constituição proíbe o trabalho de menores de 14 anos. Proíbe, principalmente, por uma questão de saúde. É nessa idade que a criança forma o corpo e a personalidade. E é nessa idade que ela tem direito à educação e a viver a infância, até para não se tornar um adulto problemático.
E o que será dessas crianças amanhã, se continuarem a trabalhar em atividades perigosas, como o corte da cana, as carvoarias, os garimpos, as indústrias de calçados, as pedreiras? A situação é realmente revoltante.
Nas pedreiras de 13 cidades do interior da Bahia, 80% da mão-de-obra é composta por crianças que, com marretas, transformam pedra em brita, embaixo do sol forte. Também na Bahia crianças de 8 a 10 anos já perderam dedos, mãos e até braços, trabalhando com o sisal.
Nas carvoarias do norte de Minas Gerais e do Mato Grosso do Sul, as crianças também são exploradas. Trabalham e vivem em condições subumanas. É aquele trabalho degradante, quase escravo, que já mencionei aqui no programa.
Os maus empresários se defendem, dizendo que empregam crianças porque elas precisam complementar a renda familiar. Na verdade, a gente sabe que o mau empresário emprega crianças porque paga a elas 10% do que pagaria a um adulto. E isso quando paga. Inclusive, em algumas atividades agrícolas, os empregadores preferem recrutar crianças, porque elas produzem mais do que os adultos.
E o que estamos fazendo para acabar com essas barbaridades? O grupo executivo, coordenado pelo Ministério do Trabalho, que combate o trabalho escravo, também está lutando para acabar com o trabalho infantil. Quando recebe uma denúncia, o grupo vai até o local, fiscaliza e multa.
Isso é muito pouco. Já estamos buscando, junto com os governos estaduais e a sociedade, outras saídas.
Agora, no dia 10 de outubro, o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil se reúne no Mato Grosso do Sul. É a primeira vez que o fórum, criado há um ano, se reúne fora de Brasília. É que lá, no Mato Grosso do Sul, a parceria para acabar com o trabalho infantil nas carvoarias está adiantada. O governo do Estado e os prefeitos dos municípios onde existem as carvoarias já estão trabalhando junto com o governo federal.
O caminho da parceria, da participação de todos, também tem de ser seguido para acabar com um outro problema grave, de que falei no início do programa: a prostituição infantil.
O governo vai dar o pontapé inicial, no dia 12. Vamos lançar uma campanha convocando a população a denunciar os casos de prostituição infantil. Na televisão, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Daniela Mercury e Renato Aragão vão pedir aos brasileiros para ligarem para o número 190, da Polícia Militar, sempre que souberem de um caso de exploração sexual de uma criança ou de um adolescente. E vão deixar bem claro que a prostituição infantil é crime bárbaro.
Como não considerar crime o que acontece com as meninas dos garimpos do Pará, Acre, Rondônia e Amapá? Há casos muito graves, que foram constatados pela Comissão Parlamentar de Inquérito que, em 1993, investigou a prostituição infantil no país. Segundo o relatório da CPI, existe prostituição infantil em várias regiões do Brasil.
No Sul, acontece mais na área rural. No Sudeste, nos grandes centros urbanos. No Centro-Oeste, principalmente no Distrito Federal, é grande o número de estupros. No Norte, a exploração sexual de crianças acontece nos garimpos, como falei há pouco. E, no Nordeste, a prostituição de menores está ligada ao turismo, o chamado "pornoturismo.
Isso não pode continuar! Nós vamos agir! Vamos combater a exploração sexual de menores com coragem e determinação.
Os Ministérios da Educação, da Saúde, da Indústria e Comércio, das Relações Exteriores e da Justiça estão se articulando para trabalhar em parceria. A Polícia Rodoviária vai repetir um programa que deu certo em 1993. Vai começar a repressão nas estradas. É que, hoje, muitos caminhoneiros transportam garotas na boléia. A polícia vai parar esses caminhões nos postos e prender o motorista.
E, aqui, eu quero fazer um apelo aos caminhoneiros: não façam esse tipo de favor. Não contribuam para o tráfico de crianças, que envergonha o país.
O governo federal e os governos estaduais precisam estar unidos. A lei tem de ser cumprida.
Você e todos os brasileiros devem entrar nessa luta. Denuncie! Esclareça as pessoas, que não sabem, que a prostituição de menores é crime, que trabalho infantil também é crime.
Nós temos de trabalhar juntos para assegurar um futuro melhor para as nossas crianças!

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