São Paulo, quarta-feira, 4 de outubro de 1995
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O novo paradigma da economia - 1

LUÍS NASSIF

Nas últimas semanas, jornais e revistas passaram a dar ênfase às novas fortunas que estão se formando no país. Grosso modo, os novos milionários poderiam ser divididos em dois tipos. Há um grupo convencional, de empresários que herdaram patrimônio familiar e o ampliaram. Em geral, situam-se no campo industrial ou comercial.
Um segundo grupo é o dos empreendedores que surgiram quase do nada e acumularam fortunas relevantes por entenderem, antes dos demais, os novos paradigmas da economia.
Esse novo paradigma consiste no conjunto de instituições que poderia ser englobado genericamente no modelo de capitalismo democrático -no qual informações e oportunidades de investimento passam a ser democratizadas, disponíveis para públicos cada vez mais amplos.
Esse modelo aprimorou o velho capitalismo, que tinha, de um lado, empreendedores industriais e comerciais, tendo como sócios grandes capitalistas com acesso a informações restritas. E ajudou a criar a maior máquina de poupança da história.
Os cada vez mais bem-sucedidos, em geral, são aqueles que aprenderam a surfar nessa onda.
Nesse modelo, o principal personagem do mercado passa a ser os fundos de investimento e suas variáveis, como os fundos de pensão -que são fundos de investimento voltados à complementação de aposentadorias.
Os fundos nada mais são do que um condomínio, no qual os investidores se cotizam e entregam a gestão a um administrador profissional -em geral, uma instituição financeira.
Os fundos acumularam somas expressivas de recursos e passaram a buscar alternativas de investimento em todo o mundo. Aplicam em títulos públicos, moedas, ações de empresas ou cotas de outros fundos de vários países.
Esse modelo gerou essa nova classe de superempreendedores, a dos banqueiros de negócios e administradores de carteiras, que se constituem na bússola que recebe informações, processa, dá-lhes tratamento e formula as estratégias de aplicação dos recursos dos fundos.

Rentabilidade
Nesse universo, a matéria-prima essencial é a informação e o objetivo final de cada estratégia é a rentabilidade do investimento.
A esses investidores não interessa imobilizar dinheiro em patrimônio. Entre um palácio de baixa rentabilidade e uma rede de carrinhos de pipoca de alta rentabilidade, ficam com a pipoca.
O habitat preferido dessa classe é o mercado de capitais e suas derivações. Seu universo de análise é o das empresas que irão receber seus investimentos. Essa nova onda mudou a face do capitalismo e se prepara para mudar a face do Brasil. Democratizou não apenas o capital como o poder. Tornou as empresas mais eficientes e as relações com a comunidade mais respeitosas.
Criou uma nova ética, que tem um lado cruel e um lado virtuoso. O cruel é a busca da rentabilidade como valor maior. O virtuoso é a implantação do profissionalismo, acabando com influências familiares sobre empresas e impondo sistemas de informação em todos os níveis.
Nos próximos dias, a coluna procurará aprofundar mais um pouco os princípios e personagens que compõem essa profunda revolução de costumes.

Dois burricos
A briga entre Fazenda e Planejamento lembra a história dos dois burricos que, amarrados entre si pelo cabresto, não conseguem chegar a um acordo e comer os dois tufos de grama que se encontram em lados opostos da estrada.
A Fazenda instituiu taxas de juros irresponsáveis, que só teriam lógica se adotadas em prazos curtíssimos. Alegou que as taxas eram necessárias para aguardar as reformas, especialmente a privatização, de responsabilidade do Planejamento. Portanto, a política só teria lógica se, na outra ponta, o Planejamento acelerasse a privatização.
Por sua vez, o Planejamento alega que não pretende privatizar a toque de caixa para não queimar patrimônio público. A alegação só se justificaria se os juros praticados pela Fazenda fossem baixos. Caso contrário, as estatais teriam que se valorizar 30% ao ano para poder acompanhar o ritmo de aumento da dívida pública.
Individualmente, os dois lados podem ter razão. Em conjunto, o governo Fernando Henrique Cardoso (que é a soma dos dois lados) está completamente errado e jogando contra o futuro uma conta difícil de saldar.

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