São Paulo, domingo, 8 de outubro de 1995 |
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a cópia autêntica
MARIO VITOR SANTOS Os Stones nem sempre tocam ao vivo em seus showsÉ verdade. Está provado. Ao menos algumas das músicas apresentadas pelos Rolling Stones em sua milionária turnê planetária não são tocadas ao vivo, mas em playback -como em qualquer programa barato de auditório do sábado à tarde. Especialistas acharam estranho que, numa parada dentro da música "Rock and a Hard Place", durante apresentação do show "Voodoo Lounge" em Colônia, na Alemanha, o som da bateria de Charlie Watts tenha surgido sem que o baterista tivesse mexido o braço. Nos shows seguintes da turnê alemã, incógnitos, os engenheiros de som gravaram várias músicas. Transformadas em padrões gráficos nos quais os sons aparecem como curvas, e analisadas em detalhes, as gravações mostraram coincidências totais. O que mais surpreendeu foi a ocorrência de identidades perfeitas, mesmo nos trechos do gráfico que indicavam paradas e oscilações. Tons iguais, notas iguais, até as falhas mostraram-se as mesmas. Notas tinham igual duração, ainda que a comparação se desse em trechos ínfimos da música, equivalentes a apenas frações de centésimos de segundo. A conclusão é que os Stones nem sempre tocam ao vivo em seus shows. Sabe-se que, nessa turnê, o grupo usou gravações ao menos em algumas partes dos shows de Hannover, Buenos Aires, Estocolmo e Schuttorf. É, de certa forma, um consolo para os ex-hippies que hoje se cansam à toa. Aos 52, Mick Jagger não é aquele super-homem assim tão resistente. A turnê já dura mais de um ano, ele ainda dá piques de cem metros no palco e canta sem ofegar por duas horas e meia, é verdade, mas com a ajuda de uma conserva musical que canta as músicas por ele. Em reportagem recente, a revista de música "Rolling Stone" revelou que o fenômeno se dissemina: mais de um quarto do que o público ouve em concertos ao vivo é pré-gravado, total ou parcialmente. Daí também a ênfase nos efeitos especiais, luzes e telões, que servem para criar outros focos de atenção nos shows, além do desempenho dos cantores. Será que é por isso que Madonna e Michael Jackson dançam, se contorcem, estrebucham sem que os microfones dos shows "live" registrem um sinal de exaustão? É verdade que músicas em playback nos shows de Jackson e Madonna são até cabíveis e se ajustam às expectativas das platéias, que desejam ver no palco um videoclipe ao vivo, sem imperfeições, o mais próximo possível do que passa na MTV. E, afinal, os dois são mesmo como máquinas, produtos, embora despertem reações diferentes. A eles se opunha o rock "feito à mão", "autêntico", generoso com o público, de que os Stones são últimos e maiores representantes. Para esta geração de frequentadores de shows, a noção de algo genuíno pode estar mais ligada ao que é falsificado. Mais vale a boa cópia do que a imperfeita obra única. Ilustração: "Antes e Depois", óleo sobre tela de Andy Warhol, 1962 Texto Anterior: primavera de cheiros Próximo Texto: ele e os presidentes Índice |
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