São Paulo, domingo, 15 de outubro de 1995
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Novela da Globo ergue bandeira antifumo

ARMANDO ANTENORE
DA REPORTAGEM LOCAL

A patrulha que persegue os fumantes de carne e osso já atinge também os fumantes de ficção.
A novela ``História de Amor", que a Globo exibe às 18h, está levantando a bandeira do antitabagismo há mais de três meses. A campanha, quase sempre, procura se amparar em tiradas cômicas. Mas, não raro, escorrega para o panfletarismo rabugento.
O principal alvo da artilharia contra o fumo é o engenheiro Rômulo Sampaio, interpretado por Claudio Corrêa e Castro.
Trata-se de um personagem claramente caricato. Falido, mora num casarão em pandarecos. A piscina está com vazamento, a criadagem reclama dos salários atrasados e os armários escondem cupins.
Mesmo assim, o engenheiro fuma. Traz sempre um charuto apagado entre os lábios. Quando mulher e filhos se distraem, arrisca umas baforadas. Para disfarçar, borrifa o ar com sprays odoríferos.
Age como um ladrão de galinhas, esgueirando-se pelas sombras. Em troca, recebe tratamento de criança.
``Não pode fumar, Rômulo! O médico proibiu!", zanga-se a mulher, Zuleika (Eva Wilma). ``Não estou fumando. Estou portando um charuto", responde o marido pego de assalto. ``Está sentindo cheiro de tabaco? Está vendo fumaça? Então! Portar um charuto não é fumar, da mesma forma que segurar um revólver não faz de ninguém um assassino."
O antitabagismo também persegue a protagonista Helena (Regina Duarte). Só que, aqui, o humor não tem vez.
Helena e a amiga Marta (Bia Nunnes) abandonaram o cigarro há dois anos. Mas, às vezes, nas horas de tensão, a personagem de Regina Duarte pensa em retomar o vício. Sempre encontra quem a desaconselhe. Quando não encontra, ela própria trata de se autocensurar, angustiada.
Num dos próximos capítulos, por exemplo, Helena pedirá um cigarro para o porteiro do prédio onde mora. Vai dar umas tragadas sem muita convicção, entre espasmos de culpa. Às tantas, a filha, Joyce (Carla Marins), irá aparecer e passará um pito na mãe.
Os patrulheiros de Helena, como os de Rômulo, praticam o antitabagismo em nome da saúde. Há, no entanto, quem o abrace em nome da civilização. É o caso do personagem Vicente Gomide (Dênis Carvalho). Paulistano, vive enumerando as vantagens de sua terra para os cariocas.
Na lista, inclui o decreto do prefeito Paulo Maluf que proíbe o fumo em restaurantes. ``É coisa de Primeiro Mundo, de cidade civilizada", costuma alardear.

Vergonha
Desde 1993, a direção da Globo recomenda que personagens de ficção só fumem ou bebam quando for absolutamente imprescindível.
``Procuro cumprir a orientação à risca", afirma Manoel Carlos, 62, autor de ``História de Amor". ``Se resolvi colocar fumantes na novela é porque acho necessário discutir o antitabagismo."
O escritor não concorda que esteja promovendo uma campanha contra o cigarro. ``Estou apenas retratando o que vejo todos os dias pelas ruas. Hoje, as pessoas têm vergonha de fumar. Os fumantes são discriminados, viraram cidadãos de segunda classe. Uma novela que se pretenda naturalista não pode deixar de abordar o assunto. Procuro fazê-lo com pluralismo, dando voz às duas partes. Quando um personagem critica quem fuma, tomo o cuidado para que o alvo dos ataques se defenda."
Fumante ``light" (``tem dias que não acendo nem um cigarro"), Manoel Carlos se diz contrário ao decreto de Maluf. ``Nunca gostei de radicalismos."

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