São Paulo, quinta-feira, 19 de outubro de 1995
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Tratado de 1895 selou relação entre os dois países

FERNANDO CANZIAN
DA REPORTAGEM LOCAL

A história dos cem anos do Tratado de Amizade, Comércio e Navegação entre o Brasil e o Japão, assinado pelos dois países em Paris, a 5 de novembro de 1895, contemplou com maior ênfase até agora apenas o primeiro dos três objetivos do documento.
Em apenas um século, o Brasil transformou-se no país que abriga o maior número de japoneses e seus descendentes fora do Japão.
São mais de 1,4 milhão de pessoas (de cinco gerações), contra os primeiros 791 imigrantes que chegaram ao porto de Santos em 1908 a bordo do Kasato Maru para trabalhar em lavouras de café no interior de São Paulo.
Nos 87 anos de Brasil, os japoneses progrediram rapidamente.
Segundo pesquisa Datafolha, eles têm grau de escolaridade e renda superior à dos brasileiros. Em São Paulo, 53% dos descendentes passaram por faculdades, e a renda familiar de 49% dos membros da comunidade é superior a 20 salários mínimos (R$ 2.000).
Nos anos recentes, a corrente migratória inverteu-se. Carregou milhares de japoneses nascidos no Brasil temporariamente ao Japão para trabalhar e ganhar dinheiro.
Hoje, cerca de 170 mil descendentes trabalham a 20 mil quilômetros de onde nasceram. Segundo o Datafolha, 18% dos descendentes de São Paulo pretendem um dia morar no Japão.
A maioria desses novos migrantes -conhecidos como dekasseguis- poupa entre US$ 1.500 e US$ 2.000 por mês com o principal objetivo (em 58% dos casos) de voltar ao Brasil e comprar uma casa própria.
Empresas como o Banco do Brasil, que constatou o alvo dessas poupanças, e a construtora brasileira Encol lançaram produtos específicos no Japão para atrair o dinheiro dos dekasseguis.
O movimento migratório desses descendentes começou pelo mesmo motivo que acabou por afrouxar o entrelaçamento das relações econômicas entre o Brasil e o Japão -um dos principais objetivos do tratado assinado há cem anos.
Até a década de 60, os japoneses investiram moderadamente, mas de forma regular, no Brasil. Em 1957, por exemplo, participaram da construção da Usiminas, em Minas Gerais.
Em meados da década de 70, deu-se o "boom", com a instalação de grandes indústrias, bancos e empresas comerciais japonesas.
O entusiasmo secou nos anos 80, durante a chamada década perdida para o Brasil.
Enquanto os dekasseguis começavam a tentar a vida do outro lado do mundo, longe da inflação e dos baixos salários, os empresários japoneses recuavam dentro do Brasil.
Para os japoneses, ficou nítida a incapacidade do Brasil de pagar dívidas externas e de controlar repetidos surtos de inflação.
Os números falam por si: hoje, o Japão destina anualmente ao Brasil menos de 3% (US$ 1,2 bilhão) do total do dinheiro que investe ao redor do mundo (US$ 41 bilhões ao ano). Comparando, os EUA recebem 45% dos investimentos japoneses e os países asiáticos mais de 20%.
Em termos de comércio, o Japão absorveu US$ 3,2 bilhões no ano passado em produtos brasileiros, o que representou 11% das exportações do Brasil.
É pouco, se for levado em conta o tamanho do mercado do Japão, que tem o segundo maior PIB (soma do valor dos produtos e riquezas de um país) do mundo (de US$ 4,5 trilhões), atrás somente dos EUA (US$ 6,3 trilhões).
No caminho inverso, os japoneses exportaram para o Brasil no ano passado US$ 1,8 bilhão, o que representou menos de 0,5% do total de suas vendas externas a outros países em 1994.

Aposta no real
Mas as relações entre Brasil e Japão podem estar prestes a tomar um novo rumo graças à recente estabilização da economia brasileira.
Esta é, pelo menos, a intenção oficial emitida pelos governos dos dois países em documentos destinados a comemorar os cem anos do tratado de 1895.
No papel, Brasil e Japão apostam em um sucesso duradouro do Plano Real e no aprofundamento das relações econômicas.
Mas no mundo real, o dos negócios internacionais, os empresários tendem a esperar um pouco mais e pretendem ver de perto as mudanças prometidas.
Em fevereiro de 96, um grupo de cem executivos das maiores empresas do Japão virá ao Brasil para avaliar os efeitos do real.
Caso a economia e suas regras permaneçam estáveis, os japoneses teriam especial interesse nos setores automotivo, de informática e telecomunicações.
São três áreas que requerem enormes e contínuos investimentos, coisa que os japoneses têm plenas condições de realizar.

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