São Paulo, quinta-feira, 19 de outubro de 1995
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Amor e ódio

CARLOS SARLI

Há pouco tempo, enquanto competia na etapa de Lacanau, na França, o australiano Barton Lynch ficou indignado ao ser derrotado pelo brasileiro Victor Ribas. Argumentou, gesticulou, xingou, não sei bem se nessa ordem.
Aos 32 anos, Barton é o surfista mais velho em atividade no Tour. São 13 anos disputando o Circuito, um título mundial em 88, um vice em 85 e sempre entre os "top-16", a elite da elite.
Ele, que deveria ser o mais adaptado às circunstâncias da competição, às vezes, perde o controle. "Wipe out".
Para alguns, fatos isolados como esse evidenciam a insatisfação provocada pelo aumento de brasileiros no Circuito. O bolo está sendo dividido com gente nova. Deixou de ser exclusividade de australianos e norte-americanos. Os brasileiros, e até os havaianos, norte-americanos só na certidão de nascimento, são os invasores.
Durante o Rio Surf Pro, discuti essa impressão com alguns dos melhores do ranking. O norte-americano Jeff Booth, o quarto do mundo, acha que os brasileiros têm sua fatia no bolo e ponto.
Sobre discriminação e favorecimentos, argumenta: "Os brasileiros são maioria entre os juízes: três mais o 'head judge', Renato Hickel". E dá um exemplo: "Na quarta etapa deste ano, em Reunião, eu precisava de 8,01 para superar o Fábio Gouveia. Tirei 8."
Por ironia, poucas horas depois desse comentário, feito durante um churrasco promovido pela Quicksilver, na sexta-feira à noite, Booth voltaria a perder pela mesma ínfima diferença, desta vez para o havaiano Kaipo Jaquias.
Kelly Slater, 23, consagrado o mais jovem campeão do mundo, em 92, habituado a ganhar e perder para brasileiros, vê nossa participação no Tour com muito mais naturalidade. Talvez porque leve ampla vantagem. Talvez porque conviva com os brasileiros desde o tempo de amador.
Barton Lynch não vencia uma etapa do WCT desde 91. Se alguma motivação especial o ajudou a vencer no Brasil, só ele sabe. O fato é que o "veterano" arrebentou no Rio de Janeiro. Fez a mala, complicou a vida de Kelly Slater e, na final, escovou o atual líder do ranking, Sunny Garcia.
Casado com a paulistana France Hazar, Lynch ainda dedicou o título a Pepê Lopes, um dos principais responsáveis pela realização das etapas do WCT no Rio de Janeiro, morto em acidente de vôo-livre durante uma etapa do Mundial, no Japão, em 1991.

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