São Paulo, sexta-feira, 20 de outubro de 1995
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Carandiru e Dante

O princípio de rebelião de ontem no Carandiru, presídio de funesta memória, traz de volta a discussão sobre o sistema penitenciário brasileiro. Comparar um Carandiru com o último círculo do Inferno de Dante talvez não faça justiça à nossa penitenciária.
Presos se revezam para dormir nos escassos centímetros quadrados que lhes cabe. A promiscuidade sexual os torna grupo de risco da Aids. As drogas circulam como que livremente. O estado em que vivem é, como em Dante, o de tortura permanente. Daí a explicação para a sucessão de rebeliões.
Construir mais cadeias poderia ser uma solução, mas, diante das enormes carências sociais do país, gastar dinheiro público construindo presídios é um insulto contra aqueles que, sem ter cometido crime, vivem igualmente nos círculos dantescos.
Se não se podem construir mais presídios, a solução lógica é, portanto, a de esvaziá-los. Como esta Folha já defendeu várias vezes, a pena de reclusão da liberdade deveria ser reservada para os criminosos cuja vida em sociedade representa ameaça física à população.
Penas de prestação de serviços e multas não só desonerariam o Estado que, afinal, paga para manter os presos, como lhe trariam benefícios. De resto, ao colocar um criminoso sem periculosidade numa cadeia, há o risco de transformá-lo em elemento de fato perigoso.
Esvaziando as cadeias a tendência é a de que o Inferno se transforme pelo menos no Purgatório e os condenados, por mais hediondos que tenham sido seus crimes, possam permanecer na condição de seres humanos.

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