São Paulo, segunda-feira, 30 de outubro de 1995
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O modelo de Santa Catarina

LUÍS NASSIF

A dinâmica do federalismo reside na liberdade que dispõe cada Estado ou município para buscar seus caminhos.
Quem trabalha mal, quebra a cara sozinho. Já as experiências bem-sucedidas são imitadas e aprimoradas pelas demais unidades.
Essa troca de experiências é que permite que o nível de qualidade do setor público cresça de maneira global -de maneira mais dinâmica do que nos modelos centralizados.
É o que ocorre hoje em dia com o tema produtividade e qualidade nos serviços públicos. Praticamente todo o lado moderno do país persegue um novo modelo. Sua definição surgirá da soma de experiências e dificuldades enfrentadas por cada um.
Santa Catarina parece ter saído na frente. No início de seu governo, o governador Paulo Affonso Vieira criou uma secretaria extraordinária para a implantação do Programa de Qualidade e Produtividade no Serviço Público Estadual.
Baseou-se na concepção de um dos mais importantes -e menos conhecidos- dos programas do governo Collor. Em lugar de um secretaria convencional, montou-se um pequeno comitê diretamente ligado ao governador, que coordena ações de produtividade e qualidade em cada secretaria.
Os braços desse comitê são "multiplicadores" -pessoas das próprias secretarias, treinadas dentro dos novos conceitos, e incumbidas de gerar novos grupos de multiplicadores.

Participação
De início, o programa concentrou-se nas áreas que tratam diretamente com o público -Junta Comercial, Detran, polícia, Procon, educação e saúde. Em lugar de estabelecer um projeto para cada área, optou-se por definir três processos gerais, e subordinar a eles as ações de governo.
Os processos básicos são: 1) geração de novas oportunidades de trabalho; 2) valorização do meio rural; e 3) preparação da criança. Esses três processos foram subdivididos em 85 projetos multissetoriais, que desembocaram em 655 ações -todas amarradas a metas quantitativas.
Surpreendentemente para a equipe de governo, a adesão do funcionalismo foi imediata. Notou-se grande ansiedade dos servidores em mudar sua situação e livrar-se da imagem de párias, muito mais fruto de modelos gerenciais ultrapassados, que impedem o aproveitamento de suas potencialidades.
Obviamente, trata-se de um processo passível de inúmeros aprimoramentos. Por exemplo, há dificuldades naturais em definir indicadores de produtividade para setores do funcionalismo que trabalham na retaguarda. Na elaboração do orçamento, ainda há trombadas, já que as verbas passaram a ser alocadas por processos, não mais por secretarias.
À distância, é impossível avaliar se sua implementação está sendo feita ou não com eficiência. De qualquer modo, trombadas e acertos serão discutidos com outros Estados e municípios. Pedra sobre pedra, o federalismo brasileiro vai se tornando uma realidade rica e irreversível.
Há dois gurus no modelo catarinense. Na tomada de consciência do governo para os novos tempos, Antônio Maciel Neto, que implantou esse sistema no governo Collor e, depois que deixou o governo, assumiu a presidência de uma companhia catarinense.
Na elaboração teórica, o mineiro Vicente Falcone, da Fundação Teóphilo Ottoni, de Belo Horizonte, apontado pelos catarinenses como a maior autoridade do setor.
Fenômeno interessante está ocorrendo com o Mercosul (acordo comercial que reúne Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai). Recentemente, o governo da província de Mendoza procurou o de Minas Gerais para conversas paralelas, sem a intermediação de Buenos Aires e Brasília.
Na semana passada, houve evento envolvendo seis governadores argentinos e quatro brasileiros, de Estados situados na fronteira entre os dois países. Esses governadores começaram a definir políticas comuns entre seus Estados para as áreas de segurança pública, saúde, cultura, ciência e tecnologia.
Será um componente poderoso na demolição do velho modelo centralista luso-hispânico, que tanto atrasou o desenvolvimento do continente.

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