São Paulo, terça-feira, 7 de novembro de 1995
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Projeto de lei do IRPJ: proposta proibitiva

VALDIR CAMPOS COSTA

Em meio a toda a polêmica gerada pela votação do parecer do deputado Prisco Viana sobre a emenda da reforma administrativa, a Câmara começou a apreciar outro importante item da reforma constitucional. O deputado tucano Antonio Kandir levou à comissão especial o projeto do Executivo sobre o Imposto de Renda das pessoas jurídicas.
Kandir procurou manter o princípio da proposta do governo, preservando a ampliação da base de incidência do tributo e redução da alíquota. Trata-se apenas de um modesto passo rumo à tão almejada e reivindicada reforma tributária, que várias entidades pretendem ver aprovada ainda em 1995 -uma utopia.
Com a aquiescência de ministros e líderes do governo no Congresso, os parlamentares empurram a reforma tributária para os próximos exercícios. O mesmo acontece com a reforma previdenciária. Argumentam que os temas são complexos e demandam maior tempo de discussão.
Na verdade, as reivindicações convergem na conclusão de que é preciso aumentar o número de contribuintes e baixar a contribuição individual, mas esbarram justamente no pragmatismo exigido para as mudanças. Ou seja, muitos admiram as propostas enquanto elas estão no papel, mas deixam-nas de lado quando sua execução inclui, pelo menos aparentemente, maior colaboração por parte deles.
Tratando, enfim, das mudanças sugeridas pelo Executivo, destacamos o projeto de lei que institui novas regras no Imposto de Renda das pessoas jurídicas.
Em relação às empresas, o projeto de lei que tramita no Legislativo pode trazer efeitos contrários aos almejados pelo capital. De acordo com as regras apresentadas, a tributação sobre lucros isentos do adicional, ou seja, aqueles limitados na faixa de até R$ 240 mil, poderão ter a carga tributária elevada em mais de 70%. A partir daí, o estrago deverá ser maior, até algo em torno de 193%.
O governo buscou ampliar a base de incidência dos impostos, mas também caprichou na dosagem sobre o lucro das empresas. Principalmente quando o cálculo for feito sobre o lucro presumido. Isso mesmo. O lucro presumido se transformou, ou melhor, está prestes a ser transformado num instrumento proibitivo.
Então, para aliviar a carga tributária, seria melhor usar o lucro real. Certo? Talvez. As empresas que pagarem o imposto nessa modalidade terão uma redução de aproximadamente 34,5% no IRPJ e 8,80% na contribuição social -isso mesmo, uma redução.
Mas, muito provavelmente, a economia decorrente dessa mudança na base de cálculo logo se perderia na incrementação operacional das empresas que a adotassem para a obtenção do lucro real, que tem de ser mensal. Seria necessária a importação de auditorias, que trabalhariam junto ao pessoal especializado e treinado, além da cobertura e ônus de toda a operação, para que não haja perdas para as empresas e para que elas não fiquem expostas a autuações fiscais por eventuais erros não-dolosos. Será preciso avaliar o custo/benefício caso a caso.
As empresas que optarem por pagar o Imposto de Renda com base no lucro presumido ou estimado terão uma "mordida substancial do leão. Senão, vejamos: uma empresa com faturamento anual de R$ 1 milhão terá um acréscimo de 71,43% no pagamento mensal do imposto. Já para as empresas de faturamento maior esse acréscimo poderá chegar a 193,14%.
Outra disparidade está na contribuição social. O governo acabou, paradoxalmente, fazendo um corte que atinge, por exemplo, a sofrível saúde pública.
O ministro Adib Jatene se empenha na criação do novo IPMF (aliás, já aprovada em primeiro turno no Senado), sob a denominação de Contribuição sobre Movimentação Financeira, quando o próprio governo está por reduzir ainda mais a dotação de seu ministério. Na tributação do lucro presumido, a perda pode ser de mais de 4%; no lucro real, de mais de 8%.
Nessa distorção não são apenas empresários que perdem, mas todos os brasileiros. Expandir a base foi um passo acertado. Mas a mudança de alíquotas acabou originando uma verdadeira armadilha.
Trocando em miúdos, o que está sendo proposto acaba por decepcionar o mais otimista entre os brasileiros que aguardam pelas reformas mais ousadas. Mudanças no setor estrutural econômico do Estado exigem profundas reflexões e, sobretudo, uma análise minuciosa por parte de técnicos. A reforma tributária deve atender ao seu objetivo principal, que é promover uma distribuição de renda mais justa, sem privilegiar ou sobrecarregar quem quer que seja.
Temos pressa em fazer reformas, mas porque queremos iniciar a reconstrução de uma nação perfeitamente viável. O governo não pode trabalhar sob pressão, mas tem que saber agir de forma equilibrada, para não ficar limitado na inversão das vítimas de injustiças.

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