São Paulo, sábado, 11 de novembro de 1995
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Reeleição

JOSÉ MENDONÇA FILHO

Ao contrário da impressão causada pelo calor do debate, não penso que constitua matéria de maior relevância a inclusão dos atuais detentores de mandatos eletivos entre os beneficiários da emenda constitucional que permite a reeleição para cargos executivos. Ou melhor, se pode ser relevante para a viabilização de projetos políticos, certamente não o é para o aprimoramento permanente das instituições democráticas. Desse último ponto de vista, a verdadeira questão respeita ao acerto da emenda em si, independente de abarcar ou não os atuais mandatários.
As vantagens da reeleição para cargos executivos são praticamente consensuais entre a classe política e a população em geral. Provam-no pesquisas de opinião e declarações numerosas dos líderes de praticamente todas as agremiações partidárias. Os argumentos a respeito da insuficiência dos mandatos de quatro anos, da impossibilidade de se tocar em questões estruturais, da importância da continuidade administrativa, da maturidade política alcançada pelo povo brasileiro -que dispensa tutela sobre suas decisões- foram incorporados ao consenso lentamente gerado.
As discussões que levaram a esse consenso foram possíveis justamente por estarem dirigidas a um vasto leque de medidas que, em seu conjunto, constituem projeto sério e consistente de se instituir uma estrutura integrada de representação democrática no país.
É preciso ter consciência que a emenda da reeleição não concede poder algum aos detentores de cargos executivos; não lhes concede um dia sequer a mais de mandato. A emenda simplesmente transfere ao povo a faculdade de decidir sobre a sua continuação no cargo. Se algum argumento enfraquece o dispositivo, ele vale para qualquer reeleição, não apenas para os atuais mandatários.
Quanto ao argumento do uso indevido da máquina administrativa pública para fins de reeleição, talvez a motivação mais forte para esse temor decorra do caráter pouco democrático dos processos políticos em nosso país. Como as instituições de controle popular não funcionavam, dependia-se de artifícios, como a proibição da reeleição, para se garantir um mínimo de alternância no poder. O mesmo raciocínio se aplica ao instituto da desincompatibilização. Não há motivo para quebrar o processo administrativo por conta de uma precaução que, por si mesma, não constitui garantia alguma de lisura do processo eleitoral.
O país está passando por um processo de renovação estrutural, adaptando-se à realidade da vida democrática e aos ventos do mundo. Esse processo tem-se beneficiado de escolhas acertadas do eleitorado, nos três níveis da Federação. Parece-me extremamente importante permitir à cidadania expressar-se a respeito da continuação do processo, através da manifestação eleitoral, sobre os atuais governantes, mantendo alguns, substituindo outros. Exercendo, enfim, seu poder soberano.

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